– Vamos!
– O que tem a dizer esta conferência?
– Linguagem no século XXI. A Sociedade Literária é nova, mas o assunto é sublime, falou Carlos, com gosto.
– Não sei… Voltará o pronome da segunda pessoa?
– Nisso não creio. Em todo caso, o assunto é sublime.
…
Quando adentramos no salão, todos já se assentavam comodamente em seus lugares. Como não houvesse assento livre à frente, tínhamos ido para o fundo, onde havia duas cadeiras a nossa espera.
Eu observava o público jovem. Quase não havia homem, mas sobravam mulheres e meninas. Estas possuíam um brilho nos olhos e tinham coloridos seus cabelos, variando em azul, rosa, vermelho, verde. Muitas se viam inquietas.
Dali a pouco, apresenta-se a conferencista. O salão era todo ouvido.
– Sapientíssima, cochichou Carlos.
Dispensado o ar de formalidade no proêmio, disparava contra a língua e a linguagem, em tom de tumulto. Entrou logo a falar de patriarcado: “o varão é mau por natureza e detém o poder de todas as estruturas sociais, logo impera sobre a mulher, com tirania.”
Então olhava para Carlos, e ele não entendia o que se passava tanto quanto eu.
Continuava a dizer: “não há homem e mulher, porém somente ser humano. A opressão está sobretudo na Língua, e os pronomes ele e ela são absurdamente discriminatórios, assim como os adjetivos terminados em o para masculino e os terminados em a, para feminino. O pronome neutro está lançado para incluir a quem antes sofria pela mão malvada do opressor. A partir de agora devem os adjetivos terminar em e, em oposição aos que determinam nosso corpo e nossa posição, isto é, os que nos controlam arbitrariamente. Aquele que o não fizer estará sempre a oprimir a mulher, sendo o varão mau por natureza.”
A oradora gesticulava tanto quanto fazia caretas. Enquanto saía o jargão de sua boca, o público se inflava. Enchia-se o espaço de Vivas à Judite.
Entrou a montar frases no que já revelava ser uma reforma radical da língua. Artigo, pronome, adjetivo, substantivo, tudo enquadrado e ressignificado. Lançava aos ouvidos a linguística, biolinguística, geolinguística, sociolinguística e psicolinguística, sororidade e criticidade, igualdade e equidade… Uma maçada.
Na saída, ruminávamos, sem capitar se a sábia Judite trazia pela mão direita a Ciência e pela esquerda, a Arte.
– Sermo sublimis! exclamei a Carlos.
– Tanti dux femina facti.
Autor:
Wesley de Souza