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quinta-feira, 25 de julho de 2024

Walküren – as três marias

Capítulo Oito

A noite estava fresca… nem muito quente, nem muito fria. E Rosa resolveu caminhar um pouco pela orla do rio.  Não havia nuvens no céu, então o firmamento parecia todo bordado com as pedras preciosas que são as estrelas, emoldurando uma lua cheia e graciosa. A luz da lua, refletida sobre as águas do rio, dava um ar sobrenatural ao local. e isso encantava a moça. Vendo aquela luminosidade tão diferente do habitual, se punha a imaginar céus e terras diferentes, onde certamente tanto poderiam morar o dragão do Carlinhos como o rato que comia a lua do Marquinho… nossa, ela ainda estava viajando nas histórias que as crianças contavam durante sua aula. Desde seu primeiro contato com a classe decidiu ser o mais lúdica possível, pois acreditava que assim seria bem mais simples para as crianças aprenderem as primeiras letras… é claro que no final do ano viria a cobrança e se ela não conseguisse vencer o desafio que era ensinar aquele batalhão de crianças a ler e a escrever… mas seu método, ao menos até o momento, estava rendendo frutos. Além disso, quando percebia que alguma de suas crianças tinha dificuldade no aprendizado, dava uma atenção toda especial para ela e no final, todos se saiam bem, inclusive ela. Suas aulas eram sempre bem humoradas… e as crianças simplesmente adoravam. E Rosa, durante esse tempo, recolhia boas histórias, que replicava para as turmas seguintes…
Rosa resolveu sentar-se um pouco em um tronco caído. E, sentada onde estava, podia observar toda a extensão da água a correr. O “chuá-chuá” das águas correndo pelo leito do rio faziam-na sonhar de olhos abertos… e não é que, meio sem querer, sentiu-se como Alice, atravessando o espelho e indo visitar um mundo invertido… Bem, invertido talvez não seja a palavra certa… mas, de qualquer forma, de repente ela se viu em um outro local que não era o mesmo em que se encontrava…
Como a Alice na história, ela viu um coelho branco correndo pela margem do rio e resolveu segui-lo. Por que? Bem, já era noite e não era muito comum um animalzinho desses correndo por ali… não naquela hora, pelo menos. Além disso, o animal corria sobre os dois pés, ereto, como se fosse uma pessoa. Ratos, ela já tinha visto caminharem dessa forma… coelhos, nunca… aliás, ela achava bonito os ratinhos, pegando o que quer que fosse com suas mãozinhas e depois saírem em disparada como se fossem miniaturas de seres humanos… agora, coelhos? Era a primeira vez que via um agindo dessa maneira… e a noite, ainda por cima. Bem, a professorinha era curiosa… quem sabe se dali não saia uma boa história para contar para seus aluninhos?
Depois de caminhar por algum tempo atrás do coelhinho, ela o viu entrar no tronco de uma árvore. Bem, ela pensou, acabou a brincadeira… afinal, se ele entrou em sua toca, não tinha como segui-lo. Mas resolveu olhar a árvore, assim mesmo. E descobriu que….bem, a passagem no tronco não era assim tão pequena… ela poderia entrar, se quisesse. E ela queria. Mesmo porque o que viu ao olhar para dentro da árvore foi um caminho sem fim, e bem lá na frente, quem estava correndo? Claro que só poderia ser o coelhinho, não é mesmo? E assim nossa Alice Tupiniquim partiu em perseguição ao coelhinho que não era da Páscoa…
A primeira coisa que notou, ao entrar naquele universo diferente, é que, embora fosse noite lá fora, ali dentro era claro… a luz inundava todo o horizonte. Não era assim tão diferente do mundo exterior… tinha árvores, flores, pássaros, insetos… ao longe ouviu uma cigarra cantar… e ao mesmo tempo, um passarinho saci… mas como podia ser isso? Se era dia, o passarinho saci não poderia cantar… afinal, seu domínio natural era a noite, e não o dia… mas ela ouviu o seu canto. E lembrou-se do que sua mãe sempre lhe dizia… “quando o passarinho saci canta longe, é sinal de que está perto… e quando ouvimos seu canto perto, quer dizer que está longe”… não fazia muito sentido na época e continuava não fazendo… mas como o canto da ave parecia bem próximo a ela, isso queria dizer que o animal deveria estar bem longe… engraçado… como seria um passarinho saci? Ela nunca tinha visto um… já ouvira seu canto muitas vezes, mas avistá-lo, mesmo… ela logo esqueceu deste pássaro, pois começou a ouvir um curiango. Eis ai outro pássaro que ela nunca viu ao vivo e a cores… mas conhecia bem o seu canto. E assim, ia caminhando, sempre em frente, e ouvindo os sons mais absurdos para o momento. E acabou sem saber se era dia ou noite, nem se estava dormindo ou acordada. O que tinha certeza era de que o lugar era meio amalucado…
Bem, pelo menos a Lebre Maluca e o Coelho Louco não apareceram para ela… foi só o coelhinho branco, mesmo. E ela já estava perto de alcançá-lo. De repente o animal começou a avançar mais devagar. Talvez ele estivesse cansado da correria. Bem, não fazia diferença para ela, o que realmente desejava era poder alcançar aquele animalzinho estranho… mas, pensando bem… tudo ali era estranho. Dia no lugar da noite, pássaros noturnos cantando fora de hora… borboletas e mariposas voando lado a lado… sim, era um lugar deveras estranho. Mas, tudo bem… o que realmente importava para Rosa era alcançar o coelhinho… e finalmente o agarrou! E aí, a surpresa… não era um coelho de verdade… era um bichinho de pelúcia! Mas… como… o que?… como isso era possível? Isso era loucura… como é que ela podia perseguir um brinquedo por toda a extensão que caminhou?  E um brinquedo inanimado… como podia?! Sim, ela ficou surpresa, com o boneco inerte em sua mão… simplesmente não sabia o que pensar…
Vamos imaginar a situação… você corre atrás daquilo que pensa ser um animalzinho… na verdade, é um animalzinho… entra dentro de uma árvore… descobre que o tempo não é o mesmo que o do lado de fora, de onde você saiu… escuta coisas que não deveria ouvir… pensando bem, a Rosa só escutou, mesmo… porque, além das borboletas e das mariposas, ela não viu mais nada, além do bichinho correndo… bem, ali estava ela, com o bichinho nos braços, com cara de boba… mas o que é que aconteceu, pensava ela… como é que este bicho veio parar aqui? E, pensando bem, o que é que eu estou fazendo aqui, ela se perguntou… e, de repente, tudo a sua volta foi se esvanecendo… a luz foi se apagando, como uma vela que chega ao seu final… e, quando deu por si… bem, Rosa havia cochilado sentada… ela sorriu… ao menos, não estava louca! Mas, então, ao olhar para o seu colo…o coelho de pelúcia que ela havia perseguido a pouco… estava ali, sem que ela soubesse como tal objeto viera até ela. Levantou-se, pegou o brinquedo, olhou-o atentamente, e não viu nada de estranho no mesmo… bem, pelo menos as crianças iriam se divertir com o coelho e a história que ela contaria sobre como o mesmo apareceu…

Tania Miranda
Tania Miranda
Trabalho na Secretaria de Estado de Educação do Estado de São Paulo e minha função é "Agente de Organização Escolar", embora no momento esteja emprestada para o TRE-SP, onde exerço a função de "Auxiliar Cartorário". Adoro escrever, e no momento (maio de 2023) estou publicando meu primeiro livro pela Editora Versiprosa...

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