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sexta-feira, 26 de julho de 2024

A taça de cristal

Capítulo Setenta e um

– Oi, meninas…

– Estela! Como…

– Como encontrou a gente?!!

– Sinceramente? Não faço a menor ideia. Simplesmente me veio uma imagem na cabeça, pedi para o motorista me trazer até essa pizzaria… e aqui estou eu…

– Bem, não fique aí, parada… sente-se…

Nesse meio tempo Helena fez sinal para que o atendente trouxesse mais um prato para a mesa, no que foi prontamente atendida… 

– E aí? Vai tomar o quê?

– O que vocês estão bebendo?

– Suco de morango com leite… está uma delícia…

– Vou querer um, também… posso…?

– Menina, se não pudesse, eu não teria pedido para trazerem mais um prato… sirva-se… essa pizza está uma delícia…

– E como ficou a bagunça lá em casa?

– Bem, até a hora que eu saí mamãe parecia estar em estado letárgico, papai convidou o Ricardo a sumir do mapa, a Selene estava brincando com suas bonecas…

– Pena que o pai não impediu aquele cafajeste de entrar em casa…

– O pai não podia fazer isso, Ceci… quem chamou o Ricardo foi a mãe…

– Ia dar encrenca de qualquer jeito…

– Mas, me diz… porque veio atrás de nós?…

– Não sei…de repente, me veio uma sensação ruim…sabe quando você sente que precisa fazer algo, senão as coisas saem do controle? Que pode acontecer alguma coisa sem volta?

– Eu tive a mesma sensação… por isso vim com a Ceci…

– O que é isso, gente?

– Verdade, Ceci… sabe o pingente que você me deu? Começou a esquentar e brilhar, e de repente me veio uma premonição de que, se eu não estivesse ao seu lado esta noite, alguma coisa ruim poderia te acontecer…

– O mesmo aconteceu comigo…

– Quando você estava saindo, meu pingente ficou vermelho… quando sai contigo, voltou à cor normal…

– O meu, também…

– Gente, deixa de bobagem… não vai acontecer nada comigo…

– Lembra do que você falou prá gente, quando nos deu uma parte do seu medalhão? 

– Que, juntas, poderíamos vencer qualquer obstáculo…

– … mas, separadas, estaríamos fracas e vulneráveis?

– Gente, não sei nem por que falei aquilo prá vocês… 

– Muitas vezes recebemos avisos que não podem ser ignorados… esse é um deles…

E assim as três irmãs acabaram com a pizza que estava à sua frente e pediram mais uma de calabresa, que devoraram em seguida. Finalmente satisfeitas, se levantaram. Cecilia se dirigiu ao caixa para pagar a conta, enquanto suas irmãs a esperavam na porta do estabelecimento. Reunidas as três, decidiram caminhar um pouco pelas redondezas, para conversar um pouco e espairecer as ideias. Fazia um bom tempo que elas não conversavam como nessa noite… uma conversa tranquila, onde o principal assunto eram recordações de sua infância… as visitas que faziam aos seus parentes no interior… se lembravam das peraltices que aprontavam, as vezes juntas, as vezes sozinhas e as consequências de seus atos… sim, pois na vida nada vem de graça e todos pagam o preço por suas ações, boas ou más… caminharam por um bom quarto de hora, quando Cecilia consultou o relógio e viu que já estava perto da meia noite… e o dia seguinte ainda era quinta feira… resolveram que era hora de irem para casa, descansar um pouco para o dia de trabalho que se aproximava. Embarcaram no carro de Helena e pegaram o rumo para uma noite de sono tranquilo… ao menos, era isso que desejavam e esperavam… mas nem sempre o destino concorda com nosso desejo, não é mesmo?… 

Após ser “gentilmente” convidado a se retirar da casa do senhor Mario, Ricardo saiu para a rua se remoendo de ódio…  embora não tivesse esboçado qualquer tipo de reação na frente de seu ex sogro, por dentro seu sangue fervia, e o desejo de vingança contra a afronta recebida aflorou de tal forma que ele sentia em seu âmago a necessidade de descarregar toda a sua raiva, toda a sua frustração. Para ele, tudo o que ocorrera nessa noite tinha apenas uma pessoa culpada… Cecilia… ela era a causa de toda a sua angustia, de todo o seu sofrimento. E ele tinha que resolver essa situação de uma vez por todas… caramba, custava ela ter lhe dado alguns minutos, custava ela ter-lhe ouvido, deixado que ele se explicasse e lhe dissesse que ainda a amava muito, muito … e que a sua vida sem ela não tinha sentido? Sim, tudo o que ele desejava era ficar alguns minutos ao lado da mulher que amava, e dizer-lhe que ela era tudo em sua vida, que a sua ausência tornava sua vida em um inferno sem fim… que ele não conseguia pensar direito sem ela ao seu lado… sim, isso era tudo o que desejava falar para sua amada… mas Cecilia, aquela maldita arrogante, negou-lhe esse direito… 

Ricardo enfiou sua mão dentro da blusa, acariciando a coronha de seu “anjo da guarda”… sim, era assim que ele se referia à pistola que adquirira a pouco tempo. Estava carregada. Era ela, o seu “anjo”, que iria terminar toda aquela situação esdruxula que estava vivendo… Cecília tinha outro homem em sua vida, ele tinha certeza, agora… afinal, só isso explicaria por que ela foi tão intolerante para com ele. Ah, mas isso acabaria essa noite… ele não iria deixa-la faze-lo de palhaço, de forma alguma.  Mulher sua não iria colocar-lhe chifre em hipótese alguma… seu “anjo da guarda” o apoiaria nessa decisão… afinal, se Cecilia não queria ser sua, também não seria de mais ninguém. Ele iria garantir nessa noite que isso jamais ocorreria com a sua pessoa… não, Cecilia não iria faze-lo de idiota… ou ela voltava para casa, ao seu lado, e os dois iriam viver felizes para sempre, ou ela iria morar em uma necrópole qualquer. Ao lado de outro homem, para que todos o ridicularizassem, dizendo que sua mulher o trocou por outro, não… jamais!

Ricardo continuou andando, sempre em frente… com esses pensamentos martelando sua cabeça… um pouco à frente encontrou um bar ainda aberto… não teve dúvidas… comprou uma garrafa de cachaça, tirou-lhe a rolha e sorveu o gole da mesma direto pelo gargalo. Limpou os lábios com o dorso da mão, agradeceu ao vendeiro e ganhou a rua, caminhando e bebendo. E foi nesse passo que terminou depois de umas duas horas de caminhada, em frente da casa de Helena e Cecilia. Encostou-se no poste e ficou olhando a casa, vigiando como um cão de caça fica à espreita para conseguir cercar sua vítima. Olhou o relógio… era pouco mais da meia noite…

Não demorou muito, e os faróis do carro de Helena brilharam no final da rua. Ricardo, apesar de levemente embriagado, percebeu a aproximação e ficou em alerta, pronto para atacar na hora que o carro parasse. As três irmãs desembarcaram… Helena costumava deixar seu veículo parado em frente à casa, uma vez que não tinha garagem na casa em que morava. Quando as três se dirigiam ao portão, Ricardo apareceu, arma em punho, gritando o nome de sua ex…

– Cecília, sua maldita… agora nós vamos acertar nossas contas! 

Tania Miranda
Tania Miranda
Trabalho na Secretaria de Estado de Educação do Estado de São Paulo e minha função é "Agente de Organização Escolar", embora no momento esteja emprestada para o TRE-SP, onde exerço a função de "Auxiliar Cartorário". Adoro escrever, e no momento (maio de 2023) estou publicando meu primeiro livro pela Editora Versiprosa...

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