Tem dia que de noite é assim mesmo. Pode acontecer de tudo, ou até mesmo nada. O cara pensa, estuda, consulta, planeja, simula, decide, mas dá tudo errado. É como disse o capitão da força aérea americana Edward Murphy “Se alguma coisa possui uma remota chance de dar errado, certamente dará errado”. Essa frase originou o compêndio conhecido Lei de Murphy. Há quem diga que diabo mora nos detalhes mas, no corre-corre em que vivemos, quem tem tempo de prestar atenção nos detalhes?
Um possível corolário é: “Quando menos se espera, aí é que nada acontece”. Ou acontece. Sei lá. O mundo, a vida, os humanos, tudo é bastante caótico. Muitos tentam desenvolver métodos, algoritmos, aplicativos e toda sorte de baboseiras para identificar seu par perfeito, ter sucesso nos negócios, sorte no jogo e coisas assim. Parece que a única certeza da vida é a incerteza e a única constante é a mudança. Vejamos dois casos muito doidos:
A união instável entre Maimônides e Salomé, dele seu início, caminhava para um final infeliz. Tudo começou com o velho clichê do encontrão. Trombaram dentro do mercado, as compras foram ao solo, abaixaram-se para pegar os pacotes e ao se levantarem, bateram cabeça com cabeça. Olharam, sorriram e o namoro começou, tal como acontece em 87% das comédias românticas de Hollywood.
Zanzibar, o sisudo pai de Maimônides, é vigia no Templo da Salvação, seita neopentecostal fundamentalista renovada. Deu ao filho o nome do mais importante intérprete moderno do Torá, embora não tenha a menor ideia do que signifique Torá, intérprete ou neopentecostal. Queria que o filho fosse pastor, mas ele se tornou vendedor de Plano de Saúde por telefone, aqueles caras que telefonam nos horários mais inconvenientes. No passado, Zanzibar nunca teve nada e hoje também não tem coisa alguma. Maimônides frequenta o Templo e segue os mandamentos, mesmo sem compreender uma palavra.
Abadia e sua filha Salomé trabalham no Cabaré “Aqui se faz, aqui se paga”. A jovem é fascinada pela figura bíblica da moça que inspirou seu nome, aquela que encantou o rei Herodes com sua dança e em troca pediu a cabeça de João Baptista numa bandeja. Ela desconhece a história e está certa de que foi graças à Salomé que surgiu a expressão “entregar de bandeja”, que é seu trabalho no Cabaré: dançarina e garçonete.
A moça, sem estudo ou vocação, continuou dançando no Cabaré e o rapaz se manteve fiel à orientação do Templo. A dicotomia entre os princípios começa justamente aí: ele é adepto de pregação e ela de pegação. Salomé adora sexo, rock, cuba libre e não quer filhos. Maimônides não bebe, não fuma e entende que sexo e casamento se destinam exclusivamente à procriação. São situações difíceis de conciliar.
Outro encontrão selou o fim do relacionamento. Num início de noite, quando ambos saiam de casa para seus compromissos, ele no Templo da Salvação e ela no Antro da Perdição, foram atropelados pela bicicleta de um entregador de pizza. Os três foram levados ao pronto-socorro e enquanto Maimônides recebia os cuidados da angelical auxiliar de enfermagem Samária, nome que homenageia à boa samaritana, Free Willy da Silva, o ciclista, pedalava prá cima de Salomé. Quando o fiel deixou o pronto-socorro, Salomé e Free Willy já estavam na casa do ciclista, na cama. Quando retornou ao P. S. para refazer os curativos, Maimônides levou sua nova alma gêmea Samária para seu lar.
O que pareceu ser um arranjo oportuno para todos, revelou-se outro desastre retumbante. Free Willy é muito violento, maltrata Salomé, não sai do Cabaré e vive ciscando as meninas enquanto a moça dança e serve clientes. Quando deixam o trabalho no inferninho, vão para o infernão do lar. Samária, que de boa samaritana não tem nada, é mandona, nervosa, viciada em assepsia e corticóides, exige que Maimônides tome vários banhos por dia e durma em quarto separado para não haver contaminação pelo hálito. Carinhos apenas esporádicos e mesmo assim com luvas descartáveis, máscara e álcool em gel.
Novo encontrão aconteceu no hospital. Maimônides terminou com Samária e foi ao P.S. devolver seus pertences. Viu Salomé tratando os ferimentos causados por Free Willy, apiedou-se da moça e levou-a para casa. Reataram a relação e combinaram conhecer o trabalho um do outro para melhor entender as respectivas particularidades.
Maimônides visitou o Cabaré, Salomé foi a um culto no Templo e os papéis se inverteram. Ele se encantou com a vida noturna, deixou de vender planos de saúde e aceitou emprego de Leão de Chácara. Ela ouviu o chamado e tornou-se monja no Templo da Salvação, mas combinaram que em casa as regras do trabalho não valem e a todo instante rola sexo, álcool e rock. Por causa da reconciliação dos filhos, Zanzibar e Abadia acabaram se conhecendo e se apaixonando. A dúvida existencial agora é se os jovens se tornaram “meio irmãos” e estariam vivendo no pecado.
Como disse o poetinha, a vida é a arte do encontro, embora haja tanto desencontro pela vida.
bom dia!
outra vez ,meus cumprimentos pelo enredo.Enredo cheio de criatividade de conhecimentos.
Obrigado pelo comentário Arildo. Abraço.
Brilhante, Laerte!
Quanta imaginação… kkkkk
Torcer para que o último encontro seja mantido, ou não.
Muito bom. Sempre criativo e iinusitado
Kkkkkk
Obrigado amiga. Grato pelo comentário. Abs
Laerte,
só a escolha dos nomes dos seus personagens já é um arraso!
Fico encantada com sua criatividade!
Obrigado Ita. Adoro seus comentários. Abraço.
Ao final o amor venceu !!! Parabéns