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terça-feira, 4 de março de 2025

Infância Roubada

Line era uma mulher muito comunicativa.

Com seus cinquenta e  poucos anos, estava sempre rodeada por amigos mais próximos, pois era extremamente seletiva, e em tudo o que era discutido ela expunha sua opinião, mas era um tanto quanto arredia.

Na maioria do tempo, sua amargura era nítida quando perguntada sobre o que era o amor, felicidade e família. Ela tentava, de todas as formas, transparecer que era uma pessoa bem resolvida e de bem com a vida, mas suas palavras duras em relação aos assuntos dessa natureza, a colocavam em xeque em qualquer ocasião. Mas, ela era muito eloquente. Saía pela tangente sempre que questionada sobre sua vida pessoal. Se privava ao máximo para não dar pistas de suas dores, pois, para ela, ninguém, absolutamente ninguém, tinha o direito de saber sobre sua verdadeira realidade.

As respostas ensaiadas por ela no dia a dia a faziam ser vista como uma mulher com dificuldade de expressar seus verdadeiros sentimentos e chegava a ser constrangedor alguns pontos de vista colocados por ela em relação a como se sentia em relação à vida.

Sua forma de ver as coisas destoava dos demais. Não que ela devesse pensar como todos, mas, a forma como ela via a vida era muito dura e sem “mas”.

Ao mesmo tempo que ela transmitia a sensação de ser uma mulher inatingível, era evidente que ela escondia algo muito forte sobre sua vida particular e que ninguém jamais soubera.

A forma como ela lidava com os assuntos pessoais a fazia ser vista como uma mulher enigmática. Era evidente o limite imposto por ela para que as pessoas não se chocassem ou tivessem pena dela.

Pena era o sentimento que ela mais temia e por esse motivo, se fechava no seu ostracismo relacionado à sua vida pessoal.

Os pouquíssimos amigos que conseguiram adentrar a sua intimidade se deparavam com seu quarto infestado de ursos de pelúcia e bonecas que a rodeavam por todos os lados. Para esses amigos que conseguiram ultrapassar aquela barreira de entrar no quarto dela, ela fazia questão de dizer que era uma colecionadora de brinquedos e eles se contentavam com essa justificativa.

Na verdade, aquele cenário construído por ela nada mais era que uma forma que ela havia encontrado de fazer as pazes com sua infância que fora roubada.

O que eles não imaginavam era que Line havia passado pelo pior pesadelo em sua infância. Molestada ainda quando era criança pelo próprio pai, Line tentava fugir daquela bagagem para lá de pesada.

Ela nunca buscou ajuda para tratar sobre esse episódio tão estarrecedor. Se privou em guardar a sete chaves aquele segredo que ela havia decretado que morreria com ela conviveu com aquela dor até o seu leito de morte.

Autora:

Patricia Lopes dos Santos

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