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domingo, 17 de novembro de 2024

No carnaval, ninguém é de ninguém

Quem nunca ouviu falar em Amor de Carnaval, a paixão instantânea que leva as pessoas ao delírio? Mas tem um problema: não funciona com o marido ou a esposa! Duvida?

O casamento de Hilal e Vera andava morno, sem aquela chama ardente que, a rigor, nunca existiu. Ela se envolveu com um aviador, acreditou que fosse o amor de sua vida, mas o cara voou para longe e ela ficou na mão e com teste de gravidez positivo. Aí ciscou para cima do comerciante Hilal, solteirão, 12 anos mais velho e louco por ela, e aplicou o “golpe da barriga”. Não é nenhum deus grego, mas tem muita grana, ou seja, é quase um “sultão turco”. Ele propôs casar para reparar o dano e o pai dela se emocionou, pois Vera é rodada na vizinhança. Mas com o tempo e o casamento, julgou que as fofocas terminariam.

O teste foi um falso positivo, a gravidez não vingou, mas Hilal não retrocedeu. Vera é jovem, bonita, corpo escultural e ele, embora bem de vida, é fraco de feição e jamais teria alguém como ela, exceto por dinheiro. Casaram-se em 20 dias, toda semana rolava sexo sem açúcar e sem sal, mas a volúpia da moça nunca se acabou.

As brigas e as cenas de ciúme eram constantes e Vera sugeriu casamento aberto para a relação não descambar (e para não perder as regalias propiciada pela grana do turquinho). Na hora ele topou, mas ao assuntar no boteco, o bartender Chico Fuinha explicou o que era aquilo e Hilal quase explodiu, mas se conteve. 

  • Então é isso? – disse aos amigos do bar. Ela quer liberdade para sair com quem quiser? Faz testdrive à vontade e depois me chuta? Ela me paga.
  • Não importa o copo em que se bebe, o que interessa é ficar bêbado – foi a sugestão de Alceu, presidente do Conselho do Bar.
  • O que você quer dizer?
  • Faça a mesma coisa você também!

As regras do casamento aberto eram: 1) Avisar quando irá sair; 2) Não sair com amigo comum; 3) Sem perguntas no dia seguinte. Ela deve ter algum esquema, pensou. Sai 2 ou 3 vezes por semana, bem arrumada, maquiada e não tem hora para voltar. Hilal engole a seco, avisa que vai sair também, mas vai beber com os amigos. 

Pouco antes do carnaval, o assunto no bar eram as desculpas em casa para dar uma escapada, até que alguém lembrou a sorte do Hilal. Com o tal casamento aberto, ele não precisa inventar desculpa. É só dizer “vou sair” e ponto final. A garçonete Magda sugeriu que saíssem no bloco carnavalesco TôKiTô, que desfilará domingo, após 2 anos inativo por causa do Covid. O TôKiTô é ideal para tiozão sem parceira e periguete à caça de patrocinador. O desfile vai das 15h às 18h, portanto sem necessidade de alvará em casa. Magda disse onde vendem abadás e máscaras e explicou as regras do bloco: os pares se formam às escuras e é proibido tirar a máscara ou revelar os nomes, mesmo se rolar sexo. É só diversão anônima e nada mais.

Vera e Hilal avisaram um ao outro que sairiam no domingo à tarde. Ninguém questionou e cada qual tomou seu rumo, ambos com uma sacola na mão. Os amigos do bar não se encontrariam. Sigilo absoluto. Depois compartilhariam a experiência no TôKiTô.

Não demorou para Hilal se dar bem. O traje de Homem Aranha cobriu o rosto por completo e ele fisgou uma Batgirl de lindos olhos, belo sorriso e corpo malhado. A máscara dela também não revelou o rosto. Após 1 hora, o calor era muito forte e ela quis se refrescar. Entraram num hotel, tiraram as fantasias, exceto as máscaras, tomaram banho e foram para a cama. A temperatura corporal foi do normal a “arre égua” em segundos, numa explosão de luz, de dar inveja à Liga da Justiça. Vários casais também abandonaram o bloco e o hotel lotou.

Às favas com as regras do bloco. Hilal retirou a máscara de Homem Aranha e Batgirl fez o mesmo. Magda, muito mais bonita sem o traje de garçonete, disse que seu primo é diretor do TôKiTô, sabia qual Homem Aranha procurar e o casal passou o restante do carnaval no hotel. Dois andares acima, a Mulher Gato e o Máscara copularam até sentirem câimbras. Também retiraram suas máscaras, mas Vera e Chico, o bartender Fuinha, não se reconheceram. Conversa vai, conversa vem, Fuinha descobriu que a Mulher Gato é esposa do Hilal, mas ficou na sua.

Na quarta-feira de cinzas, Vera e Hilal se encontraram no café da manhã na padaria, exaustos. Segundo o acordo do casamento aberto, nada perguntaram e nada disseram. Porém, ele sabia que tinha violado uma das regras, embora enganado pela máscara da Batgirl. Subitamente, decidiram acabar com o casamento aberto. Rolou até sexo de reconciliação. Diz o ditado que às vezes é melhor fazer o que se faz com vinho ruim e manter a rolha na boca. Nunca falariam sobre aqueles dias. O que acontece  no carnaval, fica no carnaval.

Semanas mais tarde, Vera descobriu nova gravidez, agora garantida. Hilal, feliz da vida, voltou ao bar para contar a novidade aos amigos. Ficou sabendo que a Magda engravidou, casou com o bartender Chico Fuinha e voltaram para o Ceará.

Coincidência, pensou Hilal. As duas grávidas na mesma época! Quem seria o pai de quem? É como dizem, no carnaval, ninguém é de ninguém! Vida que segue.

Laerte Temple
Laerte Temple
Administrador, advogado, mestre, doutor, professor universitário aposentado. Autor de Humor na Quarentena (Kindle) e Todos a Bordo (Kindle)

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