Nesta semana, a Embraer fez circular em alguns dos maiores jornais do país bem elaborada matéria de divulgação institucional, ilustrada com fotografia de um dos seus engenheiros, acompanhada de ligeira nota sobre sua vida profissional, que reproduzimos abaixo.
“Juliano de Oliveira
Engenheiro civil formado pela Escola de Engenharia Mauá. Fez mestrado em Engenharia Aeronáutica no programa interno da Embraer, realizado em parceria com o ITA. É hoje gestor de projetos de engenharia dos jatos comerciais da Embraer.”
Sem estar explícito, a homenagem ao Eng. Juliano era dirigida às centenas de profissionais engenheiros que prestam seus serviços à empresa por ocasião do Dia do Engenheiro, que se comemora em onze de dezembro, data em que, em 1933, foi assinado o Decreto 23.569 que regularizou a profissão e criou os conselhos regionais e federal regulamentadores e fiscalizadores da atividade, CREAs e CONFEA.
Houve por trás desse ato, protagonizado pelo Presidente Getúlio Vargas, uma intensa e demorada luta dos engenheiros e arquitetos pelo reconhecimento do direito de que serviços técnicos específicos fossem realizados apenas por quem detivesse, comprovados, os conhecimentos necessários ao exigido para as tarefas a serem executadas. Naquela altura, o Brasil já dispunha de escolas de engenharia suficientes para possibilitar que a sociedade tivesse garantida sua incolumidade nas obras e outros serviços.
Ao fim do primeiro terço do século XX, já se percebia o desenvolvimento da tecnologia que o caracterizaria e que arrastaria o Brasil de uma economia primária a outra muito mais complexa na qual os engenheiros seriam importantes artífices, axioma que continua válido. Por entender assim, é que na abertura do blog Conversa de Engenheiro, que edito desde 2010, consta o dístico: O DESENVOLVIMENTO DE UM PAÍS É DO EXATO TAMANHO DA SUA ENGENHARIA”.
A legislação que regula a atividade dos engenheiros ao longo desses 89 anos foi sendo alterada para abrigar os avanços da ciência e da tecnologia e as necessidades de pessoal técnico para o desenvolvimento do país. As escolas então existentes se multiplicaram e hoje são milhares de cursos a formar engenheiros.
No texto que a Embraer divulgou sobre o Engenheiro Juliano de Oliveira, chamou-me a atenção o fato de que tendo ele a graduação em engenharia civil, ocupar hoje uma função para a qual se exigem conhecimentos avançados de engenharia aeronáutica, o que se explica no mesmo texto, adquiridos em iniciativas da própria empresa, em parceria com o Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA).
A razão da minha estranheza é por serem as normas que concedem as atribuições muito restritivas, as “congelando” em compatibilidade com o histórico escolar da graduação, no caso das engenharias, nada lhes podendo ser acrescido por conhecimentos adquiridos, ainda que formais, em cursos de pós-graduação e similares.
É aqui importante ressaltar que no âmbito das empresas, a busca constante por resultados, faz valer, em primeiro lugar, o saber fazer, a competência e isso se antecipa, não raramente, aos aspectos formais, quando esses são impeditivos do bom andamento, da fluidez das soluções mais adequadas e do próprio interesse da sociedade.
Nos anos 80 participei como membro da Comissão de Especialistas do Ensino de Engenharia designada pelo Ministério da Educação para definir orientação geral para a estruturação dos cursos dessa profissão para o país. Então, eu não aceitava, e não era maioria na Comissão, a ideia da criação de especialidades precoces na área tecnológica. Posteriormente ao encerramento do trabalho da comissão (que se desfez com a saída da ministra que a nomeou), prevaleceu no sistema de ensino superior do MEC, por posição do antigo Conselho Federal de Educação, a orientação da criação de cursos especializados na área de engenharia ao nível de graduação, como hoje se vê.
Ao regulamentar cada uma dessas “engenharias”, o Confea procurou garantir espaços exclusivos de atuação a cada uma. Daí as dificuldades criadas para a aquisição de novas competências, por via de cursos que agreguem os conhecimentos necessários. A meu ver, um erro estratégico, cometido em prejuízo dos próprios profissionais.
A política de multiplicação de especializações precoces facilitou a criação de cursos de engenharia de modalidades diversas em grande número. Essa é uma situação de fato, irreversível. A melhor maneira de mitigar o excesso cometido é permitir que os profissionais da área tecnológica possam migrar entre essas especializações, mediante a aquisição controlada de conhecimentos por meio de cursos, adquirindo as atribuições equivalentes a serem concedidas pelos CREAs, de acordo com regulamentação apropriada.
A flexibilização será útil à adaptação dos profissionais a interesses e vocações pessoais e ao atendimento às flutuações do mercado de trabalho.
Crônicas da Madrugada.
Autor:
Danilo Sili Borges, membro da Academia Rotária de Letras do DF. ABROL DF e Diretor de Ciências do Clube de Engenharia de Brasília. Brasília – Dez. 2022