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quinta-feira, 21 de novembro de 2024

O estresse e o saco de pão

O estresse é uma doença dos tempos modernos. Várias situações podem causar o desequilíbrio no nível de cortisol e provocar estresse, como o trabalho, o trânsito, a vida amorosa, a família etc. Às vezes, do nada, uma coisinha à toa faz a pessoa explodir. Existe tratamento, mas não é só tomar um comprimido, xarope ou efervescente. Sua prevenção exige bons hábitos, caminhar, praticar exercícios, além de alimentação saudável e sono em dia. Apenas médicos e terapeutas podem diagnosticar e indicar tratamento, mas muitos recorrem a gurus, livros de auto ajuda de banca de jornal e influenciadores com canais no Youtube.

Algumas pessoas lidam bem com o estresse a ponto de parecer que nada as aflige. Outras desabam por qualquer motivo. Se o estresse é hereditário ou consequência do meio ambiente, nem Freud, nem Darwin explicam. Há ainda o negacionista, que não aceita que vive sob estresse e não busca tratamento, e também o que se faz de vítima, exige atenção, mas nada o consola. Eles infernizam a todos com quem convivem. 

Ao longo de décadas observando e palpitando na vida alheia, conheci tanto quem lida bem com a coisa, como quem faz da simples unha encravada um câncer em estágio terminal. Existe ainda um terceiro tipo, o pior de todos, aquele que aparenta ter tudo sob controle mas, na realidade, é um paiol de TNT prestes a explodir. Conheci um caso assim. Bem sinistro!

Inezita estudou, se formou, trabalhou, namorou, noivou, engravidou e gerou. O noivo se mandou e não casou. Ela não se abalou, recomeçou e novamente namorou. 

Genaro era um homem maduro, galanteador e respeitoso, mas apenas até se mudar para o pequeno apartamento de Inezita. Levou na bagagem a mãe, siciliana octogenária e rabugenta; a enteada, solteira e com um bebê, cachorro e gato vira latas, além da diarista, um amor antigo. O filho de Inezita, agora com 13 anos, fica na sua e ignora o grupo. Ela vive com astral elevado e tenta agradar a todos.

Família, natural ou postiça, é sempre fonte de estresse, mas Inezita lida bem com a situação. Muitos se entregam ao trabalho e evitam voltar cedo para casa para não se estressar e minimizar conflitos. É o que ela faz para manter o equilíbrio.

Hoje, teve um péssimo dia no trabalho. Chegou atrasada e perdeu briga pela promoção para a amante do diretor. Quem era sua secretária, tornou-se  sua chefe. Discutiu com a lambisgoia, o diretor ameaçou demiti-la, simulou dor de dente, pegou a bolsa, rodou a baiana e saiu. O Metrô atrasou e superlotou. Desembarcou, choveu, se molhou e um carro passou num buraco e jogou água suja. Não estressou, comprou lasanha e um saco de pães. O elevador quebrou, ficou presa 15 minutos e depois subiu pacientemente 6 andares. Entrou pela cozinha, colocou a lasanha do forno e os pães num cesto. Arrumou os cabelos, suspirou, botou sorriso no rosto, entrou na sala em grande estilo, bateu palmas e disse: Mamis chegou! Mas seu mundo desmoronou.

A diarista faltou, o gato se assustou, o cachorro rosnou, o boleto chegou, a luz acabou, o ar-condicionado parou, a TV pifou, o calor aumentou, a nona vomitou, a enteada escorregou, o vaso quebrou, o bebê chorou, o vizinho reclamou, o marido peidou, o forno apitou, a lasanha queimou e a paz acabou.

Inezita inspirou fundo, abriu a janela, assoprou e gritou dentro do saco de pães: xô diretor, xô lambisgoia, xô Metrô, xô carro, xô chuva, xô vizinho, xô marido, xô filha postiça, xô nona, xô gato, xô cachorro, xô boleto, xô diarista. Estourou o saco e disse bem alto: Xô todos os problemas! Do seu quarto, o filho gritou:

  • Mãe, silêncio! Estou no celular com a Camila.
  • Você fica quieto se não eu ponho o seu nome no saco!

A família se espantou, mas todos, em profundo silêncio, saborearam sem reclamar a lasanha queimada. É como diz o ditado: água morro abaixo, fogo morro acima e mulher estressada, ninguém controla!

Laerte Temple
Laerte Temple
Administrador, advogado, mestre, doutor, professor universitário aposentado. Autor de Humor na Quarentena (Kindle) e Todos a Bordo (Kindle)

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