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domingo, 16 de junho de 2024

Movimentos peristálticos, sexo na 3a idade, feijoada e fibrilação

Apesar dos esforços, nada de reação! Os residentes observam pela janela do CTI os monitores e as manobras nada ortodoxas da dra. Marilu, nua e ajoelhada sobre o paciente, contraindo o abdómen em movimentos peristálticos, suando e urrando a plenos pulmões. O eletrocardiograma mostra ritmo irregular, assíncrono e caótico, claro indício de fibrilação ventricular. Desfibrilador e seringa com epinefrina aguardam sobre a bancada. O procedimento de alto risco no ventrículo esquerdo é o último recurso na tentativa de ressuscitação.

            A tensão aumenta e os 4 residentes debatem sobre a alternativa adequada, desfibrilar ou injetar a epinefrina, quando a linha do osciloscópio retificou e fez soar o apito contínuo indicando o fim da vida. O alarme disparou automaticamente na mesa da enfermeira chefe da Terapia Intensiva.

Alguns andares acima, o dr. Jivago, propedeuta de cardiologia do Hospital Universitário, recebia a visita da irmã e do cunhado, o italiano Antônio Sccopia, Reverendo Anglicano e palestrante de autoajuda. O sistema de som anunciou:

  • Código azul na CTI cardíaca. Repito, código azul na CTI cardíaca.
  • Mas o que será isso? – perguntou a si mesmo o dr. Jivago.

O facultativo salta da cadeira e disparou pelo corredor. O Reverendo Sccopia pediu à esposa o lenço branco e improvisou um clérgima, colarinho clerical que lhe abriu o caminho até o CTI. Ninguém barra um religioso numa emergência.

  • Quem é aquela maluca e o que está fazendo nua em cima do Mané? – perguntou o médico.
  • É a Marilu Gatosa. 
  • Gatosa?
  • Gata Idosa, a residente de cardiologia de 66 anos, a nossa Vênus Lasciva.

A dra. Marilu acionou o desfibrilador esquecendo-se que estava nua e suada em cima do Mané, apelido do Manequim Simulador Cardíaco, boneco de borracha com mesmo peso e altura de um paciente adulto e que reproduz sintomas e níveis de gravidade, conforme o sadismo de quem o programa para aulas práticas no CTI. O choque fez Marilu cair, bater a cabeça e desmaiar. O que seria apenas simulação se transformou em emergência médica. O Reverendo Sccopia retirou o clérgima improvisado, pois o serviço religioso não se aplica a bonecos de treinamento.

Marilu, com fraturas e traumatismo craniano, permanecia em coma induzido enquanto os residentes depunham perante a comissão disciplinar. Eles disseram que ela perdeu 2 maridos e “n” namorados, todos enfartados durante o sexo. No 1o caso, achou que foi fatalidade, mas a partir do 2o, imaginou-se uma superpotência sexual, muito acima da capacidade masculina. Cursou medicina para entender o que ocorria e mapear os poderes eróticos da terceira idade. Aquela foi sua 4a experiência, só que calibrou o Mané como um atleta de 25 anos, sadio, coração perfeito e gordura corporal perto de zero. Super máquina. Programou o computador para acelerar os batimentos ao máximo durante a 3a ereção e começou seu show. A frequência chegou a 198 bpm, o Mané hiperventilou, os alarmes soaram e a dra. Marilu se atrapalhou. Usou o desfibrilador suada e nua, o Mané explodiu e ela foi ao chão.

Dias depois, fora do coma, com uma perna e um braço engessados, Marilu recebeu a visita do doutor Jivago e dos colegas residentes.

  • Já temos o diagnóstico. Você não é Vênus Lasciva, nem atleta sexual. É apenas uma idosa ninfomaníaca e irresponsável.
  • Como pode dizer uma coisa dessas? Vários homens não me resistiram na cama e morreram enfartados durante o ato!
  • Chegaram os prontuários médicos dos seus parceiros. Eles não morreram por enfarto devido à hiperatividade sexual.
  • Então o que aconteceu com eles?
  • São vários diagnósticos. Vamos lá:

O professor transformou a bronca em aula para Marilu e os residentes. Ela é, sim, sexualmente ativa e insaciável. Tem orgasmos em níveis de escala Richter e ignora os limites dos parceiros. Dois deles morreram por asfixia mecânica porque ela ficava sobre eles e, antes da bariátrica, pesava 118 quilos. Nos outros casos, exames laboratoriais constataram overdose de Viagra.

  • E o meu fofinho? O coração do meu primeiro marido explodiu na cama e até seu intestino extravasou de prazer. Aquilo não foi sexo nível interestelar?
  • Não, Marilu. Ele fermentava muito, tinha de excesso de gases e nunca usou probióticos. O legista notou acúmulo de bolo alimentar batumado no aparelho digestivo. Segundo o laudo, vocês fizeram sexo pouco depois da feijoada, ele fermentou e explodiu, por cima e por baixo.
  • Então foi só isso?
  • Sim. E tem mais uma coisa: você fez cirurgia bariátrica, reduziu o peso, mas precisa emagrecer mais uns 12 quilos, além de inverter a posição na hora do sexo.
  • Então eu não sou atleta sexual? Todos pareciam muito felizes no final!
  • Marilu, na realidade, seus parceiros atingiam o auge do prazer quando você saia de cima deles. Você é, quando muito, uma fat sexual killer!
Laerte Temple
Laerte Temple
Administrador, advogado, mestre, doutor, professor universitário aposentado. Autor de Humor na Quarentena (Kindle) e Todos a Bordo (Kindle)

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