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terça-feira, 3 de setembro de 2024

A vida em três partes

O homem comum tem o dom de simplesmente contemplar. Aquela tranquilidade de estar sozinho assim, de boa, olhando pro horizonte e ainda que o horizonte seja o outro lado da esquina do bar, é simplesmente incompreensível ao universo feminino. Nessas horas, os pensamentos são repaginados, auto análises são feitas e qualquer Fusca 74 que passa na rua é admirado como se passasse uma Sophia Loren rediviva. Quantas e quantas vezes os conhecimentos acumulados foram revistos por pessoas comuns, entre copos americano sempre pelo colarinho,  nas várias mesas de bares pelo nosso Brasil, constituindo um verdadeiro patrimônio cultural desta terra. Por minha vez, que não me dou por de fora desse grupo seleto e valendo-me de uma filosofia psicológica estritamente de botequim, tenho cá minha contribuição e estou absolutamente convencido de que a nossa vida se divide em três grandes blocos:

Quando somos crianças, o que nos resume são basicamente as influências e ensinamentos externos. Ali, recebemos as bases, ainda que visuais e imaginativas, que nos vão servir de referência de certo, errado, bonito, feio, bom e mau. Histórias infantis via de regra carregam uma conclusão moral não é não à toa. Crianças imitam.  

Chegam a pré-adolescência, os hormônios, as certezas absolutas, o vigor e a necessidade de comparação das referências externas com as adquiridas em casa. Claro, tudo em detrimento do ambiente familiar, que jamais vai retribuir a chatice à altura. Antes, acolhe tudo com complacência infinita e no que recebe em troco são só críticas e dedinhos em riste. Típica rebeldia jovem. Aqui, ainda não há experiência pessoal suficiente para confrontar a enxurrada de  informações, sugestões e utopias que chegam; por outro lado, a autonomia, o domínio de si e a força comuns ao jovem são, ainda que em parte influenciados pela primeira fase, o meio por onde as escolhas mais importantes da vida começarão a tomar forma. Vejam, dificilmente encontraremos um grande esportista, um grande intelectual, um grande músico ou mesmo um grande líder político que começou sua vida muito tempo depois da juventude. Por outro lado, o sentimento de pertencimento ao grupo fala mormente em detrimento do eu individual, modulando a alma pelas ressonâncias externas. Escolhas no nível intelectual, profissional, sentimental são basicamente os caminhos que serão seguidos nos próximos anos. E não dá muito pra escapar disso não, já que você fará o que está acostumado a fazer, não o que apenas sonha em fazer.

Passado o torpor hormonal e já vividos uns bons anos, já deu pra ver o que é a vida. Entende-se bem para qualquer pessoa razoável a ligação entre atos e consequências, já se fecharam alguns caixões de familiares e, tragédia, de precoces vidas tão jovens quanto a ele mesmo; já se deu conta de que não importa o malabarismo que se faça, o boleto da conta de luz deve ser pago. E se você achar que o limite do cartão de crédito faz parte da sua renda, estará em sérios apuros. A vida é prudência, sob pena de auto destruição. E o Diabo, quem diria, não é um libertário hedonista – é antes um lógico autoritário que cobra cada centavo das extravagâncias cometidas em nome da liberdade dita “absoluta”, passando longe de qualquer perdão salvífico. Se os filhos vierem então, grande remédio para o egoísmo! A partir de agora não é mais viver por viver pra si. Prioridades mudam, certezas são adaptadas à realidade e a contabilidade da vida adquire por força do ofício uma substância outra. O amor nasce para uma vida alheia, pequena, frágil, que vai consumir cada gota de dedicação por 23 horas para, na última hora do dia, pegar com suas mãozinhas o seu dedo e sorrir como quem diz “muito obrigado”.

Isso é simplesmente a vida acontecendo a ciclos infinitos, e dizendo pra gente como é experimentar o senso de eternidade.

Autor:

@mariojpj

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