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quinta-feira, 21 de novembro de 2024

Maçonaria, canibalismo e a mente moralista

O segundo turno começou com uma novidade. Passamos quase toda eleição com a rede bolsonarista pautando os temas dos debates e dos memes nas redes sociais. Mas desta vez o que está dominando a polêmica política são os vídeos colocados pelos apoiadores de Lula mostrando Bolsonaro e seus apoiadores em ritos maçônicos, bem como uma entrevista de Bolsonaro na qual ele admite já ter desejado participar de um ritual indígena de canibalismo.

A estratégia parece, pelo menos por enquanto, ter dado o efeito desejado. A base cristã conservadora está um tanto atordoada, a ponto de gerar esclarecimentos tanto de Malafaia quanto do próprio presidente.

Contudo este sucesso não acontece sem críticas. Parte do campo progressista critica esta escolha, pois seria utilizar das mesmas armas que o bolsonarismo se utiliza, partindo para a criação de um pânico moral e se apoiando em preconceitos, demonizando grupos como a maçonaria.

De fato esta escolha gera uma sensação incômoda de que o nível do debate político se perdeu definitivamente, e que agora o debate esta girando em torno de quem parece mais satânico aos olhos dos fundamentalistas. Em uma eleição ideal, o debate deveria ser um confronto entre projetos de nação, um debate entre propostas políticas e econômicas de cada grupo ideológico.

Mas pelo menos desde 2014 a questão moral e a “pauta de costumes” tem ganho cada vez mais destaque. Mesmo antes deste processo de moralização da pauta política já acontecia a tendência de denúncias terem mais peso que propostas. E é preciso entender que a mente moralista, o julgamento moral de figuras políticas não se faz no campo da razão, e sim da emoção.

Citando um exemplo bem simples, imaginemos que uma pessoa compre um frango assado, e, ao chegar em casa, faça atos sexuais com este frango, e depois o coma. Creio que quase todos nós temos um sentimento de repulsa moral contra este ato, mesmo não havendo nenhum crime ou prejuízo criado por tal prática. A moralidade se baseia muito em sentimentos de repulsa e rejeição. É muito mais uma reação atávica, visceral, que uma análise racional.

O bolsonarismo, sabendo desta característica irracional do sentimento moral, optou por utilizar de uma estratégia de pânico moral explorando os preconceitos religiosos utilizando de velhos fantasmas como o comunismo, a pedofilia, a promiscuidade, o uso de drogas, etc. Se os adversários representam o pior do mundo moral, se são repulsivos, então tudo contra eles se torna admissível.

É com base nesta repulsa moral que se cria contradições como a tolerância a corrupção dos aliados, a aceitação do negacionismo que matou centenas de milhares de brasileiros, e a destruição de várias estruturas estatais, como no meio ambiente, na educação, no combate ao racismo, no combate a violência, etc. É graças a este pânico moral que Pazuello, o ministro da saúde que foi responsável pela pior gestão do mundo contra a pandemia, seja premiado com milhares de votos.

Neste sentido realmente me perturba que um vídeo em que Bolsonaro participa de um evento de comemoração ao Golpe de 1964 em um templo maçônico gere revolta não pelo tema, e sim pelo local do evento. Quando parte significativa da população se preocupa mais com uma ligação de um presidente com a maçonaria do que com a comemoração de uma ditadura temos que perceber que o debate político esta adoecido.

Neste sentido precisamos tomar atitudes para desbolsonarizar o sentimento moral brasileiro. Apontar as incoerências, as mentiras, os erros e as atrocidades cometidas por Bolsonaro e seu governo tem um poder muito limitado para convencer a base de apoio fanatizada. Pois o apoio dos eleitores a Bolsonaro é um apoio moral.

Uma frase famosa de Donald Trump é que ele poderia atirar em uma criança em praça pública e mesmo assim não perderia o apoio popular. O mesmo pode ser dito de Bolsonaro. Não adianta apontar as mentiras, a incompetência, a destruição criada por este governo. Enquanto não entrarmos na questão moral ainda teremos 50 milhões de brasileiros aprisionados em uma bolha, em um campo de distorção da realidade.

Denunciar a ligação entre líderes bolsonaristas e a Maçonaria não é uma crítica aos maçons. Denunciar a ligação entre Bolsonaro e a Maçonaria é um recurso para apontar para a mente moralista que a religiosidade de Bolsonaro é fraudulenta.

É uma forma de escancarar a hipocrisia de um líder que quer se colocar como alguém em missão divina, mas ao mesmo tempo representa valores opostos ao cristianismo. Infelizmente a irracionalidade moralista é tanta que até o apoio a tortura é insuficiente para mostrar que Bolsonaro nunca foi alguém com valores morais cristãos.

Então que seja este recurso extremo de utilizar da maçonaria para retirar o véu que cobre a usurpação da religião que Bolsonaro faz. O fundamentalismo é quase invulnerável a argumentos. Então precisamos sim entrar nos sentimentos. Usar a repulsa de alguns à Maçonaria para revelar a fraude religiosa que Bolsonaro promove.

Infelizmente é a hora de falarmos dos casamentos de Bolsonaro, e como ele traiu suas esposas com amantes mais jovens, para depois casar com elas. Duas vezes. É a hora de mostrarmos que Bolsonaro já defendeu que sua esposa tinha o direito de escolher abortar Jair Renan. E de mostrar que Bolsonaro já declarou que queria ver um índio sendo cozido, e aceitaria comer carne humana para tal.

Apesar de eu considerar estas questões irrelevantes para a escolha de um presidente da república, são estas questões que podem furar a barreira ideológica. É a única forma que temos parar expor a distorção criada pelo pânico moral. Precisamos atingir primeiro o coração endurecido pelo ódio, para depois tentar trazer ternura, solidariedade, e no final, racionalidade.

Autor:

Aniello Olinto Guimarães Greco Junior 

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