A quase um mês das eleições nacionais que coroarão novamente Luiz Inácio Lula da Silva ou o atual presidente Jair Messias Bolsonaro, a China assiste dos bastidores.
Com Bolsonaro, apesar da troca de acusações sobre as origens do coronavírus, entre outros atritos ideológicos, o Brasil viu uma diversificação de suas exportações com quatro novos protocolos assinados recentemente para a exportação de farelo de algodão, carne bovina termoprocessada e melão do Brasil para China. Os agroprodutos foram o destaque do aumento das exportações do Brasil, sendo também foco do governo brasileiro, levando à inauguração do escritório da Confederação da Agricultura do Brasil (CNA) em Pequim no final de 2021.
Espera-se que tenha uma continuidade da retórica pragmática, mais favorável do que nunca para o Brasil, devido aos atuais conflitos econômicos e políticos entre China e Estados Unidos, Austrália e Índia, bem como a guerra ucraniano-russa.
Com Lula, a “parceria estratégica” que ele adotará se eleito não divergirá de quando esteve no poder entre 2003-2011. Em entrevista ao veículo de mídia chinês Guancha em junho de 2021, o ex-presidente mostrou sua admiração pelas conquistas de desenvolvimento do país asiático.
Como país em desenvolvimento, Lula projeta a China como um modelo de inpiração.
A conjuntura internacional da Guerra Fria 2.0 que coloca a China no centro das atenções globais tem uma correlação direta e intrínseca com as relações sino-brasileiras: se por um lado as exportações de agroprodutos aumentaram, a concorrência com países vizinhos latino- americanos como a Argentina por uma participação no o mercado chinês para produtos similares devem ser avaliadas. As exportações do Brasil podem ser prejudicadas por um alinhamento desse país com a China.
Confiar no comércio bilateral em vez de elaborar uma agenda de longo prazo é arriscado para o Brasil: os laços dos dois países provavelmente serão estreitados por meio do aumento da cooperação em sustentabilidade, ciências e tecnologia. O Brasil ocupa apenas a 57ª posição no Índice Global de Inovação (GII) 2021, enquanto a China ocupa a 12ª posição.
Possíveis campos de cooperação:
- Bioenergia: a crise energética que elevou os custos na América do Norte e na Europa influenciou o Brasil a acelerar seus planos para instalar o que se projeta ser o maior complexo de hidrogênio verde do Estado da Bahia. Pesquisas e investimentos conjuntos entre Brasil e China podem acelerar a produção de bioenergia vis-à-vis as necessidades da China de reduzir a dependência de carvão vegetal e fontes tradicionais de energia.
- Intercâmbio e financiamento mútuo em tecnologia e ciências: a baixa posição do Brasil no Índice Global de Inovação revelou a necessidade de investir em treinamento e capacitação para suprir a lacuna de trabalhadores digitais no país e aprimorar P&D em diversos setores, como eletroeletrônico e indústrias de computadores; automotivo; máquinas e equipamentos industriais; farmacêutico. A China, por outro lado, nos últimos anos se concentrou em atingir as metas do programa “Made in China 2025”, tornando-se o país número um em concessão de patentes em 2020, assim diminuindo a dependência de importações globais em vários setores: o desenvolvimento de sua própria indústria de semicondutores é o melhor exemplo.
O Brasil tem a chance de ter mais relevância para a China não apenas como parceiro comercial, mas também no âmbito do Comitê de Alto Nível de Coordenação e Cooperação dos BRICS e China-Brasil (COSBAN). Basta o Brasil entender que ainda há muito que se explorar nesses 49 anos de relações recém celebrados.
Autora:
Dra. Renata Thiébaut, pesquisadora da universidade da universidade de Harvard (2018-2020), residente da China desde 2005. A Renata é directors da empresa de consultoria Green Proposition e trabalha com umas das maiores empresas de internet do mundo, o Alibaba e a Tencent.