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quarta-feira, 21 de agosto de 2024

Uma história sobre equidade e igualdade

Era uma vez um colégio bastante peculiar. Havia duas turmas, com 10 alunos cada. O aluno poderia ser beneficiado de acordo com a nota adquirida. Aquele aluno que tirasse 10 em uma prova ganhava o direito de faltar a um dia de aula. Para cada turma, havia 2 professores responsáveis. Na primeira turma, 3 alunos se destacavam, e comumente ganhavam o prêmio. Além disso, 4 alunos costumavam tirar nota 8, e 3 alunos normalmente ficavam abaixo da média para aprovação. Na segunda turma, a dinâmica era praticamente a mesma.

No entanto, os professores da turma 1 começaram a ver certa tristeza no olhar dos alunos que, nos dias de folga daqueles que tiraram 10 na prova, tinham que ficar assistindo aula. E toda a vez era a mesma coisa, com exceção de algumas ocasiões, quando algum aluno entrava nesta “elite” dos que tiravam 10, e conseguia um dia de folga.

Chateados com esta situação, os professores da turma 1 decidiram que, a cada 2 folgas dos alunos que tiraram 10, 1 iria para os alunos que não tiraram esta nota. Os professores, ao fazerem isso, pensaram que estariam gerando mais união entre os alunos, pois, teoricamente, os alunos que tiravam notas 10 se sentiriam orgulhosos de estarem ajudando seus amigos. Já os outros alunos passariam a admirar mais seus colegas “nota 10”, pois era graças a estes que ganhavam folga.

Na prática, aqueles alunos que tiravam nota máxima por 2 vezes consecutivas precisavam entregar um de seus prêmios a seus colegas que desempenharam pior na prova. Os alunos brilhantes se sentiam tolos quando se viam sozinhos em sala de aula enquanto seus colegas folgavam, não graças ao próprio esforço, mas graças a quem tirou 10.

Com o tempo, os professores perceberam que aquelas raras ocasiões, em que um aluno que não costumava tirar nota máxima tirava 10, deixaram de existir. Agora, sem exceção, sempre os mesmos alunos tiravam nota 10. Afinal de contas, se o aluno vai ganhar pelo menos uma folga, é mais fácil relaxar e esperar os brilhantes alunos tirarem 10 do que se esforçar para adquirir esta nota. No final das contas, o esforço era punido, e os erros eram premiados.

No entanto, chegou um dia em que ninguém gabaritou a prova. Nem mesmo aqueles brilhantes alunos que sempre tiravam nota máxima. Com isso, ninguém ganharia folga. A maior parte da turma, composta pelos alunos que nunca gabaritavam, foi tirar satisfação com os alunos que normalmente tiravam 10. A turma já contava com a nota máxima de seus colegas. Mas esta não veio. Para acalmar os ânimos, os professores disseram que não tinha problema, que todos seriam beneficiados com uma folga, mesmo ninguém tendo tirado 10. O conflito entre os alunos foi interrompido. Mas no final da aula, os professores chamaram seus três brilhantes alunos para conversar. Os professores disseram: “ajudamos vocês hoje, mas na próxima, não posso dar folga para todo mundo. Espero que tirem 10 na próxima”.

Aterrorizados com a fala dos seus mestres, os alunos pediram ao diretor do colégio que fossem para a turma 2, onde nada disso acontecia. O diretor disse que, para isso acontecer, 3 alunos da turma 2 deveriam migrar para a turma 1.

Quando o diretor pediu 3 voluntários da turma 2 para migrar para a turma 1, imediatamente os 3 piores alunos da turma levantaram a mão. Eles sabiam que, na turma 1, não precisavam ir bem nas provas para serem premiados. Era o sonho. Com isso, os 3 brilhantes alunos da turma 1 migraram para turma 2, onde passaram a conviver com 3 brilhantes alunos desta turma.

Por outro lado, a turma 1 ficou sem nenhum aluno brilhante. Ao invés disso, nenhum aluno queria ser o melhor, muito menos tirar 10. Porque, se isso ocorresse, ele agora seria culpado por seus colegas quando não tirasse a nota. Ninguém queria esta responsabilidade. Preferiam tirar notas parecidas com a de seus colegas. E cada vez mais, as notas da turma 1 ficavam piores. Já as notas da turma 2 eram cada vez melhores.

Preocupado com a situação, o diretor exigiu explicações dos professores da turma 1. Os professores disseram que os 3 brilhantes alunos que foram para a turma 2 traíram seus colegas, e pioraram o desempenho geral. O diretor ordenou então que os 3 brilhantes alunos imediatamente voltassem para sua antiga turma. No entanto, o desempenho dos alunos nunca mais foi o mesmo. Sentiam-se desmotivados. A turma continuou com notas predominantemente ruins.

Para tentar melhorar o desempenho da turma 1, o diretor transferiu um brilhante aluno da turma 2 para a turma 1. Mas este aluno começou a ter um desempenho pior. Outro brilhante aluno então foi obrigado a ir para a turma 1. O mesmo aconteceu. Então o último brilhante aluno do colégio teve de ir a turma 1. E então deixou de tirar nota máxima. Ninguém mais tirava 10 no colégio.

Decepcionados com o desempenho dos seus filhos, os pais tiraram os alunos brilhantes do colégio. Com isso, a escola perdeu seus 6 alunos brilhantes. E quem restou? Aqueles alunos que nunca gabaritavam. Aqueles que se aproveitavam do esforço alheio. Mas, sem os brilhantes alunos, ninguém os sustentaria. E o tempo mostrará isso a eles, da pior maneira.

Ocorreu, então, uma fuga de cérebros.

Autor:

Gabriel Conversani Mito

1 COMENTÁRIO

  1. Parabéns pelo excelente artigo, Gabriel. Muito real em vários contextos atemporais. Me fez pensar nas consequências da falta de líderes, exatamente onde deveriam existir.

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