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segunda-feira, 29 de julho de 2024

O agronegócio versus a fome no brasil

O agronegócio é o fim do mundo. Não existe qualquer comprovação de que o ele será a salvação da lavoura, desculpando-me pelo trocadilho infame. Os alimentos que pomos em nossa mesa, de um modo geral, vem do pequeno ou do médio produtor. Os mercados são abastecidos em essência pela produção oriunda da agricultura familiar ou de pequenos conglomerados cooperativados de produtores agrícolas. O agronegócio está, sem dúvida a serviço do capital e a ele deve obediência. Existe para tornar os ricos cada vez mais ricos, ofuscando e prejudicando a produção em menor escala, na medida em que se utiliza de modernos sistemas de maquinário e uma rede de distribuição para mercados selecionados nacional e internacionalmente. O Brasil tem uma produção significativa de alimentos derivados do agronegócio e esse alimento nunca, ou quase nunca chega às nossas mesas. E, se isso fosse verdade, ou seja, que o “agro” tivesse esse papel predominante na distribuição de alimentos, certamente não existiria absolutamente ninguém a passar fome no país, tendo em vista que o é produzido pelo setor alcança em média 28% do PIB brasileiro, que em termos monetários chega a 2 trilhões de reais. E, certamente, deixa claro, cada vez mais o grande absurdo que isso significa. É dizer: um país que produz através do agronegócio volumes continentais de alimentos, tem ao mesmo tempo uma população em torno de 116,8 milhões de brasileiros que não tem acesso pleno e permanente a alimentos. Desses, 43,4 milhões (20,5% da população) não contam com alimentos em quantidade suficiente, o que caracteriza insegurança alimentar moderada ou grave, e 19,1 milhões (9% da população) estão passando fome (insegurança alimentar grave). É o paradoxo da produção versus a necessidade da população. Então onde reside a raiz do problema? Essa vexatória e dolorida contradição tende a ser de natureza política, tendo em vista a falta de políticas públicas adequadas, especialmente nos últimos anos, acompanhada de taxas de desemprego elevadas e desigualdade crônica decorrente da própria postura governamental, no que toca aos incentivos à produção familiar e distribuição de insumos, agravada ainda mais pela pandemia e pela falta de postura em seu combate. Entretanto, a sua face mais cruel é muito mais desumana. Dessa forma, não é possível que a encaremos como meros expectadores. A opção de privilegiar o agronegócio em detrimento da agricultura familiar é outro pilar da fome e, não por coincidência, tal opção foi realizada em outro momento nefasto da história brasileira, o da ditadura militar (1964-1985). Os agentes do agronegócio estão entre os que ajudaram a eleger e que apoiam o atual mandatário do país e boa parte dos desmontes das políticas públicas inerentes à agricultura familiar, ao meio ambiente e à segurança alimentar fazem parte do pagamento das faturas da dívida acumulada com o setor. De acordo com o geógrafo Marco Mitidiero, professor da Universidade Federal da Paraíba e estudioso do tema: “O agronegócio é, portanto, nada mais e nada menos do que um negócio. O agronegócio não está preocupado em alimentar a população em nenhum lugar do planeta”… E ainda complementa: “O Brasil tem privilegiado o agronegócio em detrimento da agricultura familiar. Com o agronegócio, o alimento é tratado não como um direito social, mas como uma mercadoria cujo propósito primordial é auferir lucro. Assim, paralelamente ao aumento da produção e da produtividade do agronegócio, temos o crescimento de pessoas sem acesso à alimentação”.

Referências Bibliográficas

MITIDIERO JUNIOR, MARCO ANTONIO. O agro não é tech, o agro não é pop e muito menos tudo. ABRA, São Paulo, 2021.

SANTANA, AURELANE A. Trabalho escravo contemporâneo rural na Bahia. In: XII ENANPEGE, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2019.

TOMAZELLI, INDIANA e FERNANDES, ADRIANA: Governo abre mão de R$ 5,4 bi em parcelamento de dívidas do Funrural. O Estado de S. Paulo. 01 de agosto de 2017.

TEIXEIRA, GERSOM. O governo Bolsonaro e a plenitude do agronegócio, 2018 (não publicado).

Autor:

Julênio Braga Rodrigues, mestre em gestão e modernização pública, doutor em educação e especialista em gestão ambiental e desenvolvimento sustentável.

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