Anotava em meu caderno as milhares de letras que se juntavam para virar palavras, frases e textos, na maioria das vezes com pouquíssimas regras e com uma forma completamente diferente de harmonia, quase perfeita e ao mesmo tempo imperfeita. Todas protestavam logo após serem criadas pela professora. Todas cantando diferentes sons, diferente cores e ideias ainda mais variadas. As anotava em meu bloco de folhas, quase cheio das revoltadas letras. Elas sabiam que sua importância era inigualável. O “à”, “-” e o “;” protestavam mais silenciosamente, choravam pois nunca foram usados de forma correta. Porém uma delas passava despercebida até no olho do mais atento: o ” “. Apesar de sempre aparecer, essa marcação nunca foi notada por ninguém. Até suas lágrimas e gritos por atenção não eram reparados.
A constante busca por atenção levou o nosso amigo, Espaço, fazer coisas inimagináveis. Tentava cobrir o seu corpo branco e pálido com sapatos pretos, assim pareceria mais com os outros caracteres que tinham um corpo moreno e vestimentas brancas. Percebeu que virou uma cópia de um irmão, o “_”, quase nunca usado em nossa harmoniosa língua. Tentou ficar moreno, tomando sol, mas apenas ficou vermelho. As peripécias que nosso companheiro fazia eram parecidas com a busca de atenção atual.
Espaço após tanto tentar, durante toda a sua vida, decidiu se acalmar, tirou suas vestimentas pretas e decidiu aceitar apenas ser um caractere base para todas as línguas existentes. Ele seguiu dessa forma por anos e mais anos. Um belo dia, enquanto uma professora, em uma sala de aula barulhenta o usa, é notado por um aluno que decide ver sua história e reflete sobre o que viu. A alegria de Espaço era maior que todas as outras letras revoltadas. Ele foi notado, seu objetivo de vida estava completo. Pela primeira vez de sua vida, pode descansar.
Autor:
Luiz Antônio Gomes de Oliveira Ramos
Ótima crônica, parabéns.