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terça-feira, 27 de agosto de 2024

Fim do dia

 – E ele não te disse nada?

– Não, né, Graça! Você conhece meu pai…

– Sim… ele é meio sistemático…

– Prá dizer o mínimo…

– Então ele te deu essa corrente.

– Deu… e você sabe como ele tem ciúmes de suas coisas… essa corrente, ele disse que ganhou do avô dele, quando era criança… não deixava ninguém mexer. E, de repente…

– Ela é de prata?

– Sim… tanto a corrente quanto o crucifixo…

– É muito bonita…

– Sim… mas só não entendi porque ele me deu isso…

– Foi depois que ele levou o defunto prá cidade, não foi?

– Sim, mas o que tem a ver?

– Maria, será que você não percebe? Ele te deu a corrente parta você se proteger dos maus espíritos que andam rondando por aqui.

Maria deu uma risada. Sua amiga não podia estar falando sério. Tudo bem, ela acreditava em fantasmas. Mas daí a achar que o falecido tinha alguma coisa a haver com o além, já era um pouquinho de exagero… ela olhou para o rosto da amiga, que permanecia séria. E seu riso foi se apagando aos poucos, tão séria sua amiga estava. Não era possível que Graça realmente acreditasse que algo sobrenatural estivesse rondando aquele lugar. Tudo bem que ela acreditasse nisso, pois era a mais medrosa das duas, mas Graça? Não fazia sentido…

– Você realmente acredita nisso?

– Acredito no que, Maria?

– Na assombração…

– Mas não era você que tinha medo de sair de casa? Lembra que me contou que ficou apavorada com a mulher de branco?

– Nem me fale. Passei a maior vergonha. Acho que aquela dona pensa que sou louca…

– Mas é isso, Maria…. seu pai te deu essa corrente para que você fique protegida contra a mulher de branco…

– Será?

E, pela primeira vez, a preocupação se estampou no semblante de Maria…

– Pensa bem, menina… seu pai te dá essa corrente abençoada, que foi presente do avô dele… pede prá você e seus irmãos não ficarem andando por aí de noite… pede prá você avisar a todos os seus amigos do perigo que está rondando a vila… tudo isso depois de encontrarem o corpo…

– Eu não tinha pensado nisso…

– Eu sei… se tivesse pensado, acho que nem de casa você saia…

Agora Maria realmente ficou preocupada. E Graça achou isso bom, pois a amiga não iria se arriscar a toa pelo vilarejo. Graça ainda não tinha visto nada que denotasse que algo fora do comum estivesse de fato acontecendo no arraial, mas preferia ficar sempre na defensiva. Pelo sim, pelo não, seu kit contra as forças do mal estava sempre em sua sacolinha, da qual não se separava nunca. Afinal, aprendera com sua mãe que a melhor defesa contra as forças ocultas era estar pronta sempre. Pois as chances de enfrentar alguma coisa além de suas forças era algo que poderia acontecer a qualquer momento… portanto era melhor estar sempre atenta a qualquer coisa estranha que pudesse ocorrer…

O dia havia se encerrado e as duas começaram a caminhar em direção à vila dos trabalhadores. Maria ia calada, pensativa. O que sua amiga tinha lhe falado a deixara preocupada. Será que a tal mulher de branco realmente existia? E se existia, será que estava rondando o arraial ou, pior ainda, a fazenda onde ela trabalhava? Nossa ela não queria nem pensar nisso… mas o medo fazia com que a imagem do monstro viesse a sua cabeça a todo instante… para tentar esquecer um pouco esse assunto, resolveu mudar o rumo da conversa…

– E o Juca?

– O que tem ele?

– Ele é bonitinho, não é?

– Acho que sim… nunca reparei…

– Tá brincando…

– Sério… nunca pus reparo nele… até fiquei surpresa quando ele veio falar comigo…

– Falar o que…

– Jura que não conta prá ninguém?

– Contar o que?

– Você jura ou não?

– Tá, tudo bem, eu juro…

– Ele me pediu em namoro…

Maria deu um sorriso largo. Graça olhou para ela, séria. O sorriso de Maria desapareceu no ato.

– Não aceitou…

– Ainda estou pensando… mas acho que não vou aceitar, não… não conheço ele direito… e não acho que ele seja o homem certo prá minha vida…

– Por que?

– Não sei… só acho que ele não serve prá mim…

– Graça… o namoro é prás pessoas se conhecerem… pode dar certo ou não…

– Não sei… é que ele realmente não faz o meu tipo…

– Sério? Menina, a maioria das moças do arraial vivem suspirando pelo sarará…

– Tudo bem… mas eu não ando… e você e o Tonhão?

– Que é que tem?

– Bom, ele arrasta a asa prá você…

– Não tem nada a ver… ele é como um irmão prá mim…

– É, mas ele não te vê como uma irmã, pode ter certeza…

– Azar dele… prá mim, vai ser sempre desse jeito que eu o vejo…

– Ahá… quer dizer que você não quer namorá-lo para o conhecer melhor…

– Claro que não… porque eu iria?

– Ué… foi o que você disse que eu devia fazer…

– Eu não gosto dele…

– Nem eu do Juca. Vê só? Pimenta nos olhos dos outros é refresco…

E as duas começaram a rir. Começaram a conversar sobre outras coisas, enquanto se dirigiam para suas casas… 

Autora:

Tania Miranda

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