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domingo, 22 de dezembro de 2024

LAWFARE No Brasil: Caso Lula E O Princípio Do Juiz Natural

Nos últimos dias, por meio de decisão monocrática, o Ministro Edson Fachin (STF)
anulou as condenações decorrentes de processos que tramitaram perante a 13ª vara federal
de Curitiba envolvendo o ex-presidente Lula.


A saber, o impasse de Lula com a justiça brasileira estimula automaticamente discussões
jurídicas, em que dois temas ganham destaque: a figura do juiz natural e do lawfare no
Brasil.


O fato é que para compreender a dinâmica dos fatos de um ponto de vista legal, é
fundamental realizar uma análise do contexto das condenações e dos efeitos legais
trazidos pela decisão do Ministro do STF.


O que diz a decisão e quais os seus efeitos?


Resumidamente, na decisão, a 13ª vara federal de Curitiba foi declarada incompetente
para julgar os processos que nela tramitaram em desfavor de Lula.
Essa decisão, na prática ‘‘derruba’’ as condenações em face do ex-presidente nas seguintes
ações penais:


• Ação Penal 5046512-94.2016.4.04.7000/PR (Triplex do Guarujá)
• AP 5021365-32.2017.4.04.7000/PR (Sítio de Atibaia)
• APS 5063130-17.2018.4.04.7000/PR (sede do Instituto Lula)
• AP 5044305-83.2020.4.04.7000/PR (doações ao Instituto Lula)


Com efeito, direitos políticos que haviam sido suspensos e que tornaram o ex-presidente
inelegível em 2018, em razão de condenação em segunda instância, foram devolvidos.
Por esse motivo, Lula atualmente não possui impedimentos para se candidatar às eleições
de 2022, o que poderá mudar caso o ex-presidente seja eventualmente condenado em
segunda instância.


Por fim, Fachin determinou que os processos contra o petista serão remetidos à Justiça
Federal do Distrito Federal. O que significa que a investigação e todas as fases processuais
deverão ser refeitas do zero.


A incompetência do foro de Curitiba


A princípio, a incompetência da 13ª vara federal de Curitiba já havia sido arguida pela
defesa de Lula e, inclusive, pelo procurador Celso Tres, considerado o ‘‘pai’’ da operação
‘‘Lava Jato’’.


O então procurador afirma que nunca houve elementos que vinculassem o foro de Curitiba
aos casos envolvendo o ex-presidente Lula, já que a capital não é a sede da Petrobrás (que
é objeto da lava jato), não é a sede da administração pública federal e tampouco do
exercício funcional dos políticos envolvidos.


Nesse contexto, para melhor entender como é estabelecida a competência jurisdicional
para julgar crimes, o art. 69 do Código de Processo Penal traz alguns critérios, quais
sejam:


I – o lugar da infração:
II – o domicílio ou residência do réu;
III – a natureza da infração;
IV – a distribuição;
V – a conexão ou continência;
VI – a prevenção;
VII – a prerrogativa de função.


Sobre isso, o procurador afirma que a incompetência do foro de Curitiba sempre foi
evidente. Afinal, nenhuma infração relacionada à ‘‘lava jato’’ teria ocorrido em Curitiba,
pois até mesmo o nome da operação se deu em razão de um posto de combustível
localizado em Brasília.


O fato é que a decisão provoca certa insegurança jurídica, seja pela aplicação tardia da
lei, seja porque os entendimentos instáveis da suprema corte acabaram oferecendo
credibilidade às teses envolvendo o lawfare.


Portanto, é buscando evitar cenários como esse que o ordenamento jurídico brasileiro
institui mecanismos para garantir a segurança jurídica dos julgamentos, assim como a
imparcialidade e o devido processo legal.


LAWFARE no Brasil: entenda o que significa


Primeiramente, o termo lawfare deriva da junção das palavras law (lei) e fare (guerra).
Na literalidade traduz-se como uma ‘‘guerra jurídica’’.


Nesse sentido, a expressão norte-americana refere-se à manipulação de leis e de
procedimentos legais para prejudicar um oponente político.


Esse termo foi popularizado no Brasil depois de ser utilizado pela defesa de Lula, que
afirma que o primeiro passo para evitar ou minimizar os efeitos do lawfare é garantir que
os processos transcorram totalmente dentro da legalidade.


Certamente, essa manobra jurídica afronta a essência do estado democrático de Direito,
por isso o lawfare é visto como uma forma de transformar a lei em um ‘‘instrumento de
guerra’’.


Princípio do juiz natural


Em contrapartida, o principio do Juiz natural, previsto no art. 5º, inciso XXXVII da CF,
é uma garantia da imparcialidade em juízo e contempla o devido processo legal. Afinal,
o Estado não poderá instituir juízo ou tribunal de exceção para processar e julgar um caso
específico, nem tampouco utilizar manobras jurídicas a fim de manipular a aplicação da
lei nos julgamentos.


Assim, uma grande característica desse princípio se destaca: a imparcialidade. Conforme
expressa Juan Carlos Hitters ‘‘Os juízes devem ser imparciais, de modo que a sua
competência seja previamente estabelecida por lei, evitando a criação dos tribunais de
exceção’’.


Por fim, a Constituição Federal estabelece garantias funcionais aos magistrados, quais
sejam: vitaliciedade, inamovibilidade e irredutibilidade de subsídio, que segundo Paulo
Bonavides são garantias que conferem proteção à instituição e visam assegurar a
permanência dela.


Considerações finais


Em resumo, pode-se concluir que a decisão proferida pelo Ministro Edson Fachin é
apenas mais um desdobramento de um impasse jurídico que ainda não foi finalizado.
De fato, a decisão trouxe impactos que refletem no mundo jurídico, político e eleitoral,
mas é importante ressaltar que a decisão não contempla em seu conteúdo qualquer análise
de mérito sobre a inocência ou não do ex-presidente em face dos processos vinculados à
‘‘lava jato’’.


Assim, toda análise realizada sobre os efeitos da decisão proferida pelo Ministro deve
trazer para o mundo jurídico conclusões vinculadas tão somente ao aspecto da legalidade
dos procedimentos realizados pelo poder judiciário.


Bibliografia
Santos, R. (08 de Mar de 2021). CONJUR. Acesso em 15 de Mar de 2021, disponível
em Consultor Jurídico: https://www.conjur.com.br/2021-mar-08/fachin-declara-perda-
objeto-julgamento-suspeicao-sergio-moro
Código de Processo Penal. decreto lei nº 3.689, de 03 de outubro de 1941. Disponível
em: http://www.planalto.gov.br/CCIVIL/Decreto-Lei/Del3689.htm.
Ferrari, M. (15 de Set de 202O). Acesso em 15 de Mar de 2021, disponível em CNN:
https://www.cnnbrasil.com.br/politica/2020/09/15/entenda-o-que-e-lawfare-o-uso-
estrategico-do-sistema-judicial
BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília.
Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm#art5
HITTERS, Juan Carlos. Derecho Internacional de los derechos humanos: sistema
interamericano. Buenos Aires: Eidar, 1993. t.II p. 151.
BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 15. ed. São Paulo: Malheiros, p. 542. 51 SILVA, op. cit., p. 588.

Sebastiao Parreira
Sebastiao Parreirahttps://spcriminal.adv.br
Advogado — OAB/GO 37.366; Formado em Direito pela Universidade Salgado de Oliveira em 2011; Professor universitário — Direito Penal parte geral e especial; Especializado em Ciências Criminais pela ESUP; Conselheiro da Associação Nacional da Advocacia Criminal — ANACRIM; Advogado criminalista reconhecido pelos serviços prestados em prol da Advocacia Criminal do Estado de Goiás; Advogado com influência no judiciário do estado de Goiás.

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