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sábado, 1 de novembro de 2025

Revolucão não prevista 

Há um movimento financeiro em curso que nenhum economista previu, nenhum relatório antecipou e nenhum algoritmo conseguiu detectar. Ele não nasceu em bolsas de valores nem em fusões bilionárias: nasceu em testamentos.

Enquanto o mundo observava a anunciada transferência de US$ 105 trilhões entre gerações, um fenômeno mais sutil e inesperado começou a se desenhar: a ascensão silenciosa de mulheres bilionárias que herdaram impérios e decidiram reescrever o manual da riqueza global.

O curioso é que nada disso surgiu de um movimento social, de uma luta por espaço ou de uma agenda feminista: surgiu de um luto. De perdas pessoais profundas nasceram novas formas de poder, e, com elas, uma mudança que o mercado financeiro ainda tenta compreender.

Segundo o Bloomberg Billionaires Index, mais de uma dúzia de mulheres entrou recentemente para o seleto grupo das 500 pessoas mais ricas do planeta após a morte dos cônjuges, o maior número já registrado. Juntas, controlam cerca de US$ 365 bilhões, quase o triplo do montante de 2016. Mas o que impressiona não é apenas o volume de capital, é o novo tipo de racionalidade que o acompanha.

Essas herdeiras não veem o dinheiro como fim, mas como instrumento. Subvertem a lógica tradicional de acumulação: investem diferente, doam diferente, lideram diferente. Preferem o tempo à pressa, o impacto à exibição, o legado à expansão. São discretas, mas não passivas; silenciosas, mas não inofensivas. Reprogramaram o poder, transformando herança em continuidade, e riqueza em propósito.

“O setor de gestão de fortunas continua tratando as mulheres como coadjuvantes, quando elas já são protagonistas da sucessão patrimonial”, afirma Michelle Yue, cofundadora da The Beam Network, uma plataforma que conecta mulheres de alta renda à educação financeira e à filantropia estratégica.

O diagnóstico explica muito: o mercado ainda não entendeu que essas novas bilionárias não estão apenas herdando fortunas, estão redesenhando a cultura do capital. Introduzem práticas de governança  e sustentabilidade em corporações antes dominadas por modelos puramente financeiros. Redirecionam parte dos recursos para investimentos de impacto e causas sociais, imprimindo no dinheiro um novo significado: o de permanência.

Nos bastidores de Wall Street e Genebra, consultores se reúnem para tentar traduzir esse fenômeno. Chamam-no de “capital emocional”, “inteligência financeira feminina”, “filantropia estratégica”. Mas nenhum termo parece captar o essencial: a transformação não é sobre gênero, é sobre consciência.

Essas mulheres não querem provar nada a ninguém, apenas conduzir o que herdaram com coerência, equilíbrio e visão. Elas entenderam o que muitos bilionários ainda ignoram: o tempo é o único ativo que não se multiplica. Por isso, aplicam-no com precisão cirúrgica, não em ostentação.

O mercado, acostumado a medir poder em cifras e relatórios, ainda não encontrou uma métrica para o que está acontecendo. Mas talvez seja simples: pela primeira vez, o dinheiro ganhou voz feminina, e, sem precisar gritar, começou a mudar o mundo.

Autora:

Claudia Cataldi

Jornalista, M.Sc.em Ciência Política e Relações Internacionais, 

Presidente da Associação Brasileira de Imprensa de Mídia Digital e Eletrônica RJ 

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