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domingo, 8 de setembro de 2024

56 – … Fica no campo

– Tem ideia de para onde foram, Maria?

– Eu sei para onde foram…

– Como é que você pode saber, Maria?

– Eles estavam comentando que iriam para Nazaré Paulista… parece que iam se juntar a outra comitiva, lá…

– Bem, mas quem é que pode afirmar isso? De repente só deram essa pista para que nos perdêssemos…

-Acho que não… quando ouvi essa história, a gente não tinha rendido o Zé Ferreira, ainda…

– Opa! Então, Nazaré Paulista, lá vamos nós…

E as três seguiram noite adentro, tendo como destino final a cidade de Nazaré Paulista, onde esperavam encerrar aquela história de uma vez…

– Graça…

– O que foi, Rosa?

– Eu não sei vocês… mas eu estou com sono…

– A gente tem que alcançar aqueles cabras, mulher….

– E o que vamos fazer, quando encontrá-los?

– Capturar todos, é claro…

– Do jeito que estamos? Eu estou pendendo de sono… e vocês não estão em melhores condições…

– Rosa, sinto muito… mas não vamos parar essa noite, não… eu quero alcançar aqueles salafrários… afinal, eles tem no máximo umas duas horas de dianteira…

– Graça, deixa de ser teimosa… nem eles nem a gente tem condições de seguir adiante essa noite… nós estamos com sono… eles estão bêbados, cansados e com sono… dá para a gente descansar um pouco, antes de continuar a jornada…

Maria, que até então ficara calada, resolveu dar seu palpite…

– Acho que a Rosa está certa, Graça… mesmo porque, no escuro, a gente vai acabar perdendo a pista do grupo… melhor descansar umas duas horas, pelo menos, antes de continuar a perseguição…

Vencida pela maioria, Graça assentiu positivamente com a cabeça… e afinal, as duas estavam com a razão… ela também se sentia cansada do dia que precedera esta noite… de repente, um pequeno descanso ajudaria o grupo a ter sucesso em sua caminhada… mesmo porque o número de inimigos aumentara… bem, elas teriam que decidir o que fazer com o grupo, quando o encontrasse… afinal, apenas Zé Ferreira tinha valor para elas… o resto do pessoal era perfeitamente descartável… cavalgaram por mais uma meia hora, até que encontraram um lugar aceitável para descansar um pouco. Desmontaram e arrumaram seus apetrechos, tiraram a sorte no palitinho, para ver qual das três ficaria em vigília, enquanto as outras descansavam… coube a Maria guardar o sono das amigas…

O sol estava alto na campina, e as três garotas cavalgavam já a um bom tempo. Descansadas e revigoradas pelo repouso, se sentiam em condições de vencer o mundo… Zé Ferreira que as aguardasse… apenas Maria e Graça estavam armadas com o rifle, Rosa não carregava nenhuma arma, fora o laço pendurado em sua sela… e a boleadeira, é claro… é verdade que as três carregavam um punhal, mas em um enfrentamento contra armas de fogo, será que valeria de alguma coisa? Bem, só poderiam saber se daria certo ou não quando enfrentassem a situação…

Passava do meio dia quando avistaram um povoado não muito longe de onde estavam. Resolveram fazer uma parada… afinal, com certeza ali deveria ter uma taverna, uma pensão… um lugar qualquer que servisse uma refeição decente… e elas estavam famintas… depois de cavalgarem mais um pouco, viram uma hospedaria com o nome ” Glückliche Ecke”… Graça olhou para a placa e fez um olhar de estranhamento… Maria também não entendeu nada…. mas Rosa animou as amigas… 

– Vamos lá, garotas… vamos comer de verdade, agora…

– Porque essa alegria, menina? O que é que você viu que te deixou tão animada?

– Oras… hoje vamos comer algumas comidas típicas de meu povo…

– Não entendí…

– Bem, vocês sabem que eu vim do Rio Grande….

– Não, eu não sabia…

– Nem eu… você está falando agora…

– Está bem… bom, eu sou dos pampas…

– Eu sempre pensei que os gauchos descendiam dos guaranis…

– Alguns, sim… outros, como eu, descendem de outros povos… minha família é de origem alemã…

– E…?

– Bom, essa é uma pousada alemã… então vamos fazer uma refeição típica da minha terra…

– Então vamos…

As três apearam, entraram no estabelecimento. Uma senhora simpática veio ao seu encontro. O local estava vazio no momento, elas eram as primeiras clientes do dia… da cozinha vinha um cheiro bom de comida, que tinha o dom de aumentar a fome das meninas. Escolheram uma mesa próxima da saida, sentaram-se em posição estratégica… afinal, nunca se sabe o que pode acontecer, não é mesmo? O fracasso da noite anterior continuava vivo em suas memórias, e elas não queriam ser pegas de surpresa novamente… Rosa estava toda animada…. começou a falar com a senhora… Graça e Maria ficaram olhando para as duas, sem entender nada… que diabos elas estavam falando? Depois de algum tempo, a senhora veio à mesa das garotas com uma bandeja com alguns pratos que elas nunca tinham visto… claro, comida se parece com comida em qualquer lugar, mas a aparencia era um pouco diferente do que estavam acostumadas….

-Graça, experimente esse schupfnudeln, você vai amar…

– Schu… o quê?

– Vamos dizer que se parece com um “penne” ou um “gnocchi”… é muito bom…

Maria olhava para a salsicha branca que estava na travessa… Rosa a incentivou a experimentá-la…

– Menina, você vai simplesmente amar essa weisswurst, é uma delícia…

Maria olhou o prato de Rosa e falou…

– Bem, isso ai eu sei o que é… é uma almondega…

– Isso… a königsberger klopse é uma almondega… e é muito boa…

Depois de se fartarem com os pratos oferecidos por Dona Greta, a dona da hospedaria,  Rosa resolveu que era hora de experimentarem ao menos um doce, e pediu três krapfen, no que, de pronto Graça falou, quando os doces chegaram…

– Ora, isso eu conheço… são carolinas…

– Eu sei… mas aposto que você não sabia que era um doce alemão…

– Eu sabia que era um doce… e isso me bastava…

Comeram seus doces, pagaram pela refeição e voltaram a ganhar as ruas. Sim, estavam realmente satisfeitas… agora era só descansar um pouco e voltar a pegar a estrada. Sentaram-se no banco da praça, ficaram vendo o movimento da cidade… depois de algum tempo, Rosa levantou-se e começou a conversar com um dos moradores do local que passava por ali. Depois de alguns minutos, retornou até suas amigas e deu a boa noticia… o grupo que estavam perseguindo havia passado por ali a cerca de umas três horas. Considerando que eles também deveriam ter parado para descansar e comer alguma coisa, se elas saissem imediatamente em seu  encalço, a distancia entre eles diminuiria…

Graça nem pensou duas vêzes… saiu em disparada, como se uma legião de demônios a perseguisse, e foi direto para a estrebaria, pegar seu cavalo. As suas amigas chegaram pouco depois, mas sem a afobação desta…

– Graça, ficou doida, mulher?

– Prá que essa correria? Um minuto a mais, um minuto a menos…

– Rosa… Maria… a gente não está tão longe daqueles cabras… se sairmos agora, pode ser que até o cair da noite a gente consiga alcançá-los…

– Sei… e depois?

– Depois? A gente recaptura eles, oras…

– “Eles”? Que eu saiba, só nos interessa o Zé Ferreira…

– Sim, mas… não temos como pegar o Ferreira se não pegarmos os outros, também…

– Tá… e o que fazemos com “os outros?

– Sei lá… a gente vê na hora….

Rosa suspirou profundamente… Maria simplesmente murmurou…

– Isso não vai dar certo…

As três montaram e ganharam a campina. Graça resolveu imprimir uma velocidade maior em seu cavalo, mas as duas amigas a repreenderam na hora…

– Está doida, é?

– Graça, você quer matar seu cavalo, mulher?

– O que eu quero é pegar logo aquele… aquele…

– Eu sei que você está com raiva… mas judiar de seu cavalo não vai te acalmar…

– Maria, quando eu penso que aquele… poxa, ele já estava em nossas mãos…

Rosa olha consternada para Graça, não sabe como se desculpar com a amiga. Maria percebe o embaraço de Rosa, e dá um puxão de orelha em Graça…

– Menina, ninguém tem culpa do que aconteceu… não era prá dar certo… é por isso que temos que ir com muita calma…

– Graça, me perdoe… eu… eu não queria ser a causa da nossa derrota… mas acabei sendo..

– Não se preocupe, Rosa… eu também fui culpada… deveria ter desarmado o caboclo antes de te mandar prende-lo… acontece… é por isso que estou furiosa… como eu pude ser tão descuidada, meu Deus?

Dito isso, as três seguiram em silêncio. O sol continuava sua trajetória pelo céu e depois de algum tempo se curvava a Oeste, se escondendo atrás das montanhas… de repente, Rosa chama a atenção das amigas…

-Maria, Graça… olhem lá…

– Olhar aonde, garota?

– Lá… no meio daquele arvoredo… 

 As três frearam suas montarias e ficaram observando o horizonte por algum tempo. Então as duas perceberam o que Rosa tentava mostrar-lhes… no meio do arvoredo saia uma coluna de fumaça… ou era um incêndio… e não tinha características de incêndio… ou era um acampamento. E Graça tinha certeza de que haviam finalmente alcançado seu prêmio…

Sem dizer uma palavra, as três se separaram, indo cada uma para uma direção… tentariam cercar Zé Ferreira e seu grupo. Não seria fácil, uma vez que além do Zé, haviam mais seis companheiros ao seu lado. E elas eram apenas três… Por esse motivo sabiam que teriam que manter a atenção redobrada, ou corriam o risco de repetir o fracasso do dia anterior… mas Graça estava decidida a resolver a situação de uma vez por todas, não importava qual fosse o final… devagar, lentamente, as três iam se embrenhando pela mata, tomando todo o cuidado para que ninguém percebesse seus movimentos…  sim, as garotas se sentiam verdadeira onças selvagens emboscando suas vítimas…

Autora:

Tania Miranda

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