Por: Willians Fiori
O crescimento das farmácias no Brasil reflete profundas mudanças na sociedade, especialmente com o envelhecimento da população. É impressionante ver que, nos anos 70, havia cerca de 12 mil farmácias no país, e hoje esse número chega a aproximadamente 90 mil. No entanto, ao contrário do modelo americano, onde grandes redes dominam o mercado, aqui mais de 70% das farmácias ainda são independentes ou associadas, enquanto apenas 20% pertencem às grandes redes.
Essa característica deveria ser um trunfo, mas algo se perdeu pelo caminho. Antigamente, as farmácias de bairro eram muito mais do que pontos de venda de medicamentos – eram espaços de acolhimento e cuidado. Ali, o farmacêutico conhecia o nome dos clientes, sabia quem eram suas famílias, entendia o histórico de saúde e oferecia conselhos que iam além do técnico. Era um modelo “hi-touch,” baseado na conexão humana, no olhar atento e na confiança.
Hoje, muitas farmácias foram transformadas em centros de estética ou varejo generalista, com vitrines lotadas de produtos que não remetem à saúde. No balcão, a famosa fila para ser atendido esconde o vazio desse relacionamento: o farmacêutico ou atendente muitas vezes não sabe quem você é, desconhece seu histórico e, pior, pode não se lembrar de você na próxima visita.
Essa desconexão nos leva a refletir sobre o que realmente queremos e precisamos de uma farmácia. Em um mundo altamente conectado e tecnológico, será que não deveríamos resgatar um pouco do que as farmácias representavam nas décadas de 50, 60 e 70? O modelo “hi-tech” é necessário, sim – com aplicativos, inteligência artificial e inovação para melhorar a experiência do consumidor. Mas ele não pode substituir o “hi-touch,” que é o toque humano, a empatia e a proximidade.
O envelhecimento da população traz uma oportunidade única para as farmácias se reinventarem. Pessoas mais velhas, em especial, buscam não só produtos e serviços, mas acolhimento e orientação em um momento da vida em que as demandas de saúde se tornam mais complexas. Uma farmácia que alia tecnologia com esse toque humano pode não só atrair clientes, mas criar relações duradouras, baseadas na confiança e no cuidado.
O desafio está lançado: como transformar as farmácias brasileiras em espaços que acolhem, escutam e cuidam, ao mesmo tempo em que aproveitam o melhor que a tecnologia tem a oferecer? Talvez o segredo esteja em resgatar o que funcionava no passado e adaptá-lo às necessidades do presente – criando um modelo que seja moderno, mas que nunca perca sua alma.