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sexta-feira, 19 de abril de 2024

 Empresas podem ter prejuízo bilionário ao ano por não saberem negociar acordos trabalhistas, afirma pesquisa

Pesquisa inédita do juiz do trabalho Rogério Neiva aponta que empresas podem ter prejuízo de cerca de R$ 2 bilhões ao ano por não saberem negociar acordos trabalhistas na fase de conciliação. O tema foi apresentado pelo magistrado em sua tese no programa de doutorado do Departamento de Psicologia na Universidade de Brasília expondo dados relevantes sobre a conciliação em processos trabalhistas. O trabalho teve como orientador o professor Jorge Oliveira Castro.

O objetivo foi investigar o comportamento das partes envolvidas na negociação de conflitos submetidos ao Poder Judiciário, utilizando metodologias científicas e conceitos teóricos da psicologia comportamental. “O estudo consiste em usar métodos e estratégias de pesquisa inerentes às ciências empíricas e comportamentais no estudo da postura e comportamento das partes em processos judiciais”, afirma Neiva.

Rogério Neiva deu início ao trabalho ainda em 2013, e teve como foco processos que chegaram ao judiciário antes e depois da reforma trabalhista.

Em 42% dos casos analisados, nos quais foram apresentadas propostas de acordo pelas duas partes, mas seguiram para a sentença, foi constatado que o réu (empresa) leva a pior ao não fazer o acordo no valor proposto pelo empregado. Ou seja, a empresa arcaria com menos se aceitasse uma proposta de acordo do trabalhador.

Em contrapartida, foi constatado que apenas em 21% dos casos o autor (trabalhador) perde ao não aceitar a proposta da empresa, ou seja, acaba recebendo um valor superior ao final do processo, rejeitando o acordo.

Ainda do lado das empresas, ao ser apurado a estimativa de prejuízo e considerando os valores pagos por ano aos trabalhadores na Justiça do Trabalho, constatou-se que pode chegar a R$ 2 bilhões.

Pesquisa

O estudo foi dividido em duas grandes partes e tecnicamente se encaixa no conceito de pesquisa longitudinal. A primeira parte analisou 251 processos que chegaram ao judiciário antes da Reforma Trabalhista e teve o intuito de acompanhar toda a tramitação dos processos. Dentre eles, 150 foram resolvidos por acordo e 101 foram finalizados com o processo judicial.

Foi constituída uma base de dados dos processos nos quais na primeira audiência, voltada à conciliação, houve a apresentação de propostas de acordo. Posteriormente, foi apurado se teria ocorrido acordo na audiência seguinte.

E em relação aos processos que não tiveram acordo na audiência de instrução e seguiram para o julgamento, após o trânsito em julgado (esgotados os recursos), foi coletado o valor final da condenação estabelecida pelo Judiciário.

Logo após, passou-se a contar com duas bases de dados: uma formada pelos processos que foram solucionados por acordo na segunda audiência e outra formada por processos que foram resolvidos por meio de um julgamento. 

A partir dos dados, foram realizadas análises estatísticas para a apuração de fenômenos e ocorrências que pudessem ter relevância. O juiz trabalhista Rogério Neiva explica que o comportamento humano diante dessas situações é explicável por estudos sobre comportamentos de escolha que existem desde a década de 1970. “Ao mesmo tempo, significa que se perde oportunidade de resolver o processo com um custo menor”, avalia.  

A segunda parte da pesquisa foi centrada na investigação do valor da causa e dos impactos provocados pela Reforma Trabalhista (Lei 13.467/2017) sobre esse valor. Nessa fase, foram analisadas outros 145 processos que chegaram à justiça após a Reforma Trabalhista. 

A pesquisa foi feita com levantamento de processos que tramitam no Tribunal Regional do Trabalho da 10ª Região, com sede em Brasília.

Conciliação com a Reforma Trabalhista

Uma das inovações trazidas pela Reforma foi a necessidade de que os pedidos apresentados em ações trabalhistas tivessem que contar com a indicação do valor.  Com isso, o valor da causa passou a contar com maior precisão, refletindo o que realmente estava sendo demandado, contribuindo para uma proposta de conciliação mais adequada à realidade de cada caso. Antes da reforma, o advogado poderia lançar como valor da causa um montante aleatório, o que dificultava a proposta de conciliação pela empresa.

Segundo a pesquisa do juiz Rogério Neiva, é possível considerar que a Reforma Trabalhista trouxe um resultado positivo, para efeito de contribuir com a solução consensual dos processos. As propostas dos trabalhadores-reclamantes passaram a ter maior relação com o valor da causa, o que resulta em maior qualidade dessas propostas.

Para Rogério Neiva, fica evidente que o Judiciário deve ajudar as partes a preverem o que pode ocorrer no futuro do processo, caso não se chegue ao acordo e siga para o julgamento. “Existem cuidados éticos necessários, mas essa compreensão pode ajudar na qualidade das propostas de acordo, pois é preciso que as empresas entendam que estão perdendo boas oportunidades de resolver processos com custo menor e é possível entender os comportamentos das partes nas negociações para solucionar conflitos a partir de modelos teóricos da psicologia, e isso pode ajudar a chegar ao consenso”, afirma.

“Os achados e constatações da pesquisa podem contribuir com a melhoria das negociações, o que tende a levar a mais acordos, os quais proporcionam soluções mais céleres dos processos judiciais e reduzem a carga de trabalho do Judiciário”, conclui Neiva.

Autora:

Wlyanna Gomes

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