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segunda-feira, 24 de junho de 2024

Educação: um olhar sobre o sofrimento infantil

Ao longo da história da literatura, podemos encontrar a infância sendo mencionada como a melhor e mais encantadora fase da vida. O poeta e escritor Fernando Pessoa, em uma das suas citações, apresenta uma face interessante dos pequeninos. Em “mais vale ser criança que querer compreender o mundo”, pessoa revela a simplicidade dos pequenos no seu modo de viver, o que os predispõem a uma felicidade mais genuína que nos adultos. Na infância, não existem as preocupações com os porquês da vida. É da natureza infantil, estar de forma plena nas interações, desfrutando com inteireza das próprias vivências.

A despeito de a infância ser considerada pelas suas características como a melhor etapa da vida, ela não está imune as intempéries. A criança tem maior vulnerabilidade em absorver os impactos negativos dos problemas no seu ambiente. Muitas vezes, é difícil para algumas pessoas entenderem que crianças podem ter sofrimentos psíquicos, chegando a quadros depressivos. Assim, por esse desconhecimento, os adultos podem expor os pequenos às condições adversas, em espaços de discórdias e desentendimentos.

Nessa linha, adultos podem ainda entender erroneamente os sinais de problemas psicológicos dados pelos pequenos, interpretando como simples pirraça, manipulação ou uma forma de chamar a “atenção dos outros”. Divórcios complexos, alienação parental, problemas econômicos, negligências, enfermidades e bullying, são alguns exemplos de situações que influenciam o equilíbrio e o bem-estar. Assim, como nos adultos, a depressão na infância pode surgir a partir de diversas situações conflitantes, e apresentar sintomas como alteração do humor e do afeto.

Estudos apontam como sintomas de depressão em escolares a anedonia que é a perda de prazer em atividades que gostava anteriormente de realizar, redução do apetite, cefaleia, insônia ou hipersonia, irritabilidade, tristeza, isolamento social e autoimagem negativa. No que diz respeito a aprendizagem, crianças com depressão podem apresentar problemas de memória e concentração, atrapalhando a aquisição e a consolidação de novos conhecimentos abordados pela escola.

As alterações emocionais e comportamentais em crianças, necessitam sempre de serem observadas com cautela. É na infância que os pilares da personalidade vão se formando e a aquisição de habilidades para a autonomia se consolidam. Na escola, as alterações emocionais são mais bem observadas pela intensidade das interações sociais. Assim, nesse contexto, a parceria da escola com os pais se faz necessária para a identificação do problema.

A avaliação junto a serviços especializados como neuropediatria, psiquiatra infantil e psicologia, devem ser indicados e pode significar a prevenção de maiores prejuízos ao desenvolvimento. Outra questão importante é que altos e baixos fazem parte da vida, assim como as frustrações, e não significam necessariamente a presença de depressão.

Conforme os conhecimentos da psicologia, a inteligência emocional é a capacidade em administrar as próprias emoções e usá-las de forma construtiva. Nessa perspectiva, os pais devem aproveitar a oportunidade de ensinar os filhos a lidar com momentos de contrariedade nas interações com seus pares, de forma de modo mais resiliente. Crianças resilientes são mais adaptáveis à vida e menos suscetíveis a problemas emocionais.

Cabe enfatizar que, é primordial que os adultos enfrentem os problemas pessoais, mantendo os filhos distantes dos conflitos. Crianças necessitam de proteção das adversidades das quais não tem condições cognitivas de compreender. Os pequenos podem atribuir a si mesmos, culpas pelos problemas familiares. Pais maduros evitam envolver os pequenos nas dificuldades conjugais, procurando resguardá-los de danos psicológicos e emocionais. Proporcionam ambientes seguros para seus filhos.

Ressalto aqui, uma das contribuições do pediatra e psicanalista Winnicott (1896 – 1971), que desenvolveu em seus estudos, conceitos importantes sobre o desenvolvimento emocional, onde enfocava que todos nascem com potencial para a saúde. No entanto, esse potencial segundo Winnicott, dependerá de um ambiente com cuidadores dispostos a compreender as necessidades da criança possibilitando as condições para o pleno desenvolvimento.

Em suma, não foi o objetivo desse artigo, contrapor as menções poéticas sobre a criança. Crianças nos inspiram. A felicidade está na simplicidade que elas revelam no modo de viver. Não há dúvida que na infância reside a fórmula de aproveitar a vida com plenitude. Desse modo, carregar para a vida adulta a leveza na forma de existir, ajuda a escapar do estresse e suas consequências. Talvez as crianças dos tempos dos poetas, eram bem mais cuidadas que atualmente. Pais mais presentes. Essa pode ser a razão da visão alegre impregnante dos poetas.

Afinal, é bom ser criança? Sim! No entanto, nem sempre encontraremos crianças em condições favoráveis e com a estabilidade necessária. A estabilidade leva ao equilíbrio. Esse equilíbrio depende de adultos comprometidos com o bem-estar das crianças. Muitas têm sido vítimas ou provocadoras de fatalidades. As mídias têm revelado diariamente esses dados tristes. A esses episódios frequentes dos últimos tempos, cabe atenção máxima de todos. O que está acontecendo com as crianças? Observemos os ânimos alterados, que poderão apontar para abusos velados culminando em irremediáveis tragédias.

Dessa forma, entende-se que educadores conscientes do seu papel, são zelosos, receptivos, acessíveis e compreensivos. Estão sempre atentos. Não são negligentes na sua atuação, mas entendem a importância de observar a caminhada da criança. Colocar grandes lentes de contato sobre elas. Assim sendo, a infância terá maiores perspectivas de ser bem-sucedida. Deem limites, mas, protejam nossas crianças. Não exijam, apenas. O futuro depende desse olhar diferenciado hoje. Pensemos nisso!

Autora:

Rosa de Fátima Fernandes de Aguiar Santos, Psicóloga clínica (CRP:0517611), especialista em Neuropsicopedagogia, Pós-graduada em Docência do Ensino Superior, Palestrante, Professora Universitária, com experiência nas disciplinas de Psicopatologia e Fundamentos da Neuropsicologia em turmas de Pós-graduação, coautora no Livro: Diálogos em Neuropsicopedagogia na Educação e Saúde, lançado na Bienal do Livro no Rio de Janeiro em 2019. Criadora da página Frases Terapêuticas no Facebook.Rosa Santos

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