Com a vara na mão – sem menção à conotação fálica possível -, enxotamos as galinhas do vizinho. Elas que se danem. O vizinho é outra pessoa e as galinhas dele não têm valor nenhum diante das minhas. Inclusive, há um tanto de inveja daquelas aves roliças e fecundas. É ovo atrás de ovo. Galo pomposo que, certamente, tem relógio.
As minhas galinhas, porém, apesar de defasadas, magricelas, quase depenadas e frígidas, não sofrem da minha vara, pois em galinha do quintal não se bate.
A lógica de preservar o galinheiro próprio e atacar – por inveja, ódio ou vingança
– o galinheiro alheio preserva as comunidades e movimentos opostos pelo fator pertencimento. O que me impediria de ao menos ver as minhas galinhas feias e quase morrendo? Posso ter demorado para construir o galinheiro, mas, ainda assim, ele pode ser um fracasso. Um hormônio, no melhor dos cenários, resolveria.
Criticar o modo exuberante de buscar uma liberdade inalcançável por parte da comunidade LGBTQIA+ é tido, exatamente, como o crime moral de bater em galinha do quintal. Você deve aceitar o dever de se relacionar aberto, do poliamor e sobretudo do desafeto.
Todo esse arsenal militante, porém, é a mais pura identificação institucional. Nós nos identificamos e nos pautamos pelos nos pais, seja pela repetição ou pela negação. Você não quer se casar e prefere transar com meio mundo sob o argumento da monogamia não ser natural. Criou-se a pompa de um discurso biológico pra travestir a piranhagem. Ao cabo, deve-se ter um plano, ou não. Mas é necessário pôr em prática um plano, saber onde pisa, pois o sintoma o assaltará quando menos esperar. E agora, José? A festa acabou. O Grindr parou de existir, ficou obsoleto. Sua pança cresceu e a disfunção erétil veio. E agora, José? Seu discurso militante não é mais sex appeal.
A alteridade funciona e opera. A maçã nunca cai longe da macieira. Se não podemos pensar novos rumos e aprumar as galinhas do nosso próprio quintal, como podemos ter a pachorra de falar do galinheiro alheio? Há questões intrínsecas, tais quais a perda do rumo, do objeto de militância e a “liberdade” sintomática, que precisam ser repensadas em conjunto e com seriedade antes de se criticar os demais pontos da encruzilhada de opressões.
Provavelmente, surja uma nova questão: quem eu sou primeiro? Qual é o meu quintal? Essa pergunta move.
Autor:
Arthur Dartagnan Chaves dos Santos