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quinta-feira, 28 de março de 2024

Maria é nome de homem

Foi em algum dia entre 2018 e 2019 que, timidamente, matriculei-me numa disciplina de psicanálise vinculada à Faculdade de Comunicação da Fundação Armando Álvares Penteado. Á época, cursava direito; trabalhava em um escritório chique uma rua acima da faculdade.

Todo o cenário, porém, me empurrava para fora do direito. Estranho, não? Já descontente com o descompromisso das ciências jurídicas com o pensamento livre, sistemático e multidimensional, fui, claro, para a ala dos vagabundos. Envolvi-me com a gente que fazia cinema de rua, deixava barba e cabelo crescer. Falavam de uma mulher brava, professora que “reprovava muito” (sic), “braba mesmo” (sic). O nome dela era Maria Lúcia. Até então, minha equação tinha somente a ânsia de sair do direito, uma rede de contatos totalmente ligada à arte e, sutilmente, às filosofia e psicanálise.

Pelo YouTube, uma mulher havia me incomodado muito em sua fala mansa e seus olhares profundos – mergulhadora profissional, diria. Maria Homem. Seriam as duas a mesma pessoa, Maria Lúcia e Maria Homem?

Pois bem. Cheguei na sala de aula, segundo andar, do prédio da comunicação. Diferentemente das demais salas, não havia nenhum à porta, todos estavam sentados e quietos. O que aconteceria ali de diferente? Já estava ansioso por saber se aquela mulher do vídeo era tão surpreendente quanto parecia.

Entra, então, de estatura baixa, roupa discreta e básica, inabalável, quase sussurrante, Maria Homem na sala de aula. O silêncio imperava; isso nem nada a incomodava. Ela carregava uma bolsa pequena e um livro à mão; era o do Ailton Krenak.

Seus títulos chiques não foram citados na aula inaugural. Ela pediu, gentilmente, que, quem não estivesse pronto para se dedicar, trancasse a disciplina.

Toda minha carga de entender sobre arquitetura, urbanismo, filosofia e o especial interesse pelas teorias da subjetividade encontrou um resguardo violento na Profa. Dra. Maria Lúcia Homem. Ela não era pop ainda, não tinha milhões de visualizações. Aprendi às duras penas que subjetividade não era bagunça. E que psicanálise pressupunha trabalho árduo e interesse contínuo.

Ao cabo, a pergunta foi uma só: vai encarar? Cá estou eu, encarando dia-a-dia. Não fossem Maria Homem, Yara de Novaes, atriz e minha professora de teatro por um ano, Carlos Batalha, Marcos Schahin e Carlos Boucault, filósofos de nível, elegância e resistência, não teria guinado por outros rumos após a frustrada tentativa de ser operador do direito.

Autor:

Arthur Dartagnan Chaves dos Santos, Psicanalista. Acadêmico de medicina. @arthurdartagnanchaves

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