22.8 C
São Paulo
terça-feira, 12 de março de 2024

“Aqui não é a sua casa!”

Quando a criança bagunça além da conta ou você, adulto, exalta os ânimos na festa de família, logo escuta “aqui não é sua casa”. Na casa do outro, não se pode fazer tudo; mas em casa se pode? Ao outro não se pode tampouco se deve infligir mal ou até mal-estar. A si, supostamente, se poderia.

Os limites entre banheiro e sala, por exemplo, coagem qualquer indivíduo em gozo das faculdades mentais a saber que é feio – até patológico – fazer cocô no sofá. Essa foi uma frase que ouvi da Maria Homem, psicanalista balaústre da nova geração de “intelectuais não intelectuais”, e muito mais do que nas aulas de história da filosofia e hermenêutica, aprendi o que era ética. É, basicamente, sobre saber alguns limites universais e seus constrangimentos subjetivos.

Fazer cocô no sofá não é uma ação com o condão de lhe mandar para a cadeia. Legalmente, não é reprovável. No campo subjetivo, onde estão a espiritualidade, os afetos e os laços interpessoais, o constrangimento, porém, é gigantesco. “Você está louca”, um esbravejaria. Outros se calariam e escandalizados se manteriam. “Acho que a mamãe demenciou”, diria a filha cautelosa aos irmãos. A pessoa deixaria de ser pessoa, pois gente que é gente sabe que não se pode fazer cocô na sala.

Se há algum ponto de partida para a discussão do conceito de ética, creio ser esse. O campo se abre para outros lugares, obviamente: fazer xixi na cara alheia seria similar a fazer cocô no sofá; a fetichização do antiético (já ouviu falar da obra “Anti- Édipo”, dos franceses Deleuze e Guattari?) leva à busca do terreno ético e, também, dos lugares nos quais ela pode ser suspensa em nome do gozo.

Há quem se delicie ao ver, propositalmente, a parceira no coito com o outro. Golden shower, voyeurismo, scat, dentre outras inúmeras práticas, são apenas alguns exemplares do binômio ética-desobediência que nos acompanha.

Pergunto: o que você sabe que não pode fazer na casa do outro, mas, na sua, talvez possa? E aquilo que é inadmissível?

Autor:

Arthur Dartagnan Chaves dos Santos, Psicanalista. Acadêmico de medicina. @arthurdartagnanchaves

DEIXE UMA RESPOSTA

Por favor digite seu comentário!
Por favor, digite seu nome aqui

Leia mais

Patrocínio