Um pombo verde acinzentado no meio de nós

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Eu ia passando por aquelas ruas em reforma, passei de frente a muitas lojas de sapatos, de roupas e de utilidades. Me vi de repente em uma praça, com alguns coqueirais, mais adiante uma igreja católica, antiga e de arquitetura quase barroca. Mas o que me chamou atenção foi um pombo a alguns metros de distância. Parecia um pontinho verde na selva de pedras, ao quebrado, parecendo estar coberto de cinzas, talvez fugido de alguma mata queimada. Era um pombo verde acinzentado, com duas bolinhas pretas, uma em cada asa como se fossem dragonas e com perninhas incrivelmente vermelhas. Era um vermelho vivo que combinava com seus olhinhos da mesma cor. A princípio tomei um leve susto, nunca imaginei aquelas tonalidades para um animal daqueles. 

À medida que fui andando, fui me aproximando daquele pombo que lindamente desfilava no meio de uma multidão de trabalhadores que passavam por aquele lado da praça, bem no centro da cidade. As pessoas passavam e nem percebiam o pombo, ignoravam-no, não sei se propositadamente ou não. O pombo, em sua pose estufada, “barriga pra dentro e peito pra fora”, também as ignorava. Mas aí é que está, parecia que ele sabia o que estava fazendo. Ele olhava para os lados e prestava atenção em tudo, naquele movimento natural de pássaro, como uma galinha movimentando a cabeça para frente e para trás, levantando as asas para cumprimentar as autoridades.

Eu fui andando e prestando atenção naquilo, tanto no pombo quanto nas pessoas. Era natural que o pombo prestasse atenção nas pessoas ao redor, afinal, esses seres maléficos poderiam pisar nele e aí seria o seu fim, imagino. O que foi preciso para o pombo saber disso? Arriscaria a dizer talvez que ele próprio já viu um pombo ser pisoteado, desde então, percebeu que isso seria muito ruim se acontecesse com ele. E assim também é com as pessoas. Elas com certeza não gostariam de pisotear um pombo, eu acho. Mas não chega nem a ser uma opção, elas deliberadamente ignoravam sua existência. O pombo que se virasse e se defendesse.

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Quando cheguei ao lado do pombo, ele não olhou na minha direção. Foi aí que entendi que o pombo também ignorava as pessoas. Não havia diferença. Tudo corria normalmente como sempre aconteceu. Pessoas e pombos dividiam o mesmo espaço, todos os dias, andando, nadando ou voando. Todos apressados, competindo para ver quem conseguia mais recursos ou melhores salários, quem chamava mais atenção com suas tonalidades exageradas, naturais ou não. Ninguém prestava atenção a ninguém e assim o mundo seguia. Eu que fui tolo em imaginar que de alguma forma existia algum grau de consciência em um pombo. Pombo que é pombo, de consciente e de santo, não tem nada. 

Ao passar mais próximo a igreja vi uma revoada de pombos, de muitas cores e tamanhos em frente à estátua de uma águia. Todos desesperados por um pedaço de pão ou miudezas que por ali se encontravam. Não muito diferentes das multidões, com seus aparelhos celulares, bolsas e maletas. Um total desespero, pressa e agonia num calor infernal de tempos de crise climática em um centro urbano.

Autor:

Robson

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